15 janeiro 2021

Capas assustadoras, filmes nem tanto

De vez em quando faço algum post sobre peculiaridades da época das videolocadoras (décadas de 1980 e 1990). É um tempo do qual sempre me lembro com saudade. Quem tem 40 anos ou mais e tinha como um dos passatempos favoritos o aluguel de fitas de vídeo também há de se lembrar. 

As locadoras eram, de fato, uma caixinha de surpresas. Além dos blockbusters hollywoodianos sempre disputados pelos clientes dos videoclubes (algumas fitas nem paravam na lojas, de tanto que eram alugadas), havia também aquelas fitas nas quais a gente olhava a capa, mas ficava na dúvida. 



O popular recurso de recorrer à opinião dos atendentes de videoclubes nem sempre funcionava. Alguns eram sinceros e davam opiniões igualmente confiáveis. Outros apenas falavam genericamente, elogiando a fita, mesmo que nem tivessem assistido. 

Como na época os filmes de terror eram os que eu mais gostava de alugar, passava muito tempo analisando as longas prateleiras de terror e suspense. "A arte da capa do vídeo não parecia tão importante inicialmente, até que alguns desses filmes de terror principais começaram a aparecer”, explica Graham Humphreys, criador de cartazes de filmes, no ótimo documentário In Search of Darkness (2019), que destrincha a produção de filmes de terror dos Estados Unidos da década de 1980. “E com base em seu sucesso, de repente essas capas se tornaram bastante importantes."

Algumas capas chamativas despertavam minha curiosidade e me faziam imaginar cenas terríveis e assustadoras, baseadas na arte gráfica apelativa que ostentavam.

Também no documentário In Search of Darkness, Michael Gingold, ex-editor-chefe da revista norte-americana Fangoria (especializada em filmes de terror, ficção e seus subgêneros) esclarece: "Eles tinham que ter essa arte lá para você pegar um título desconhecido em vez de algo com o qual você pudesse estar familiarizado por ser lançamento de cinema.”

Este recurso me fez alugar fitas com capas assustadoras, mas filmes pouco (ou nada) arrepiantes. Justamente por isso, apesar de hesitar, eu acabava alugando e constatando que o terror alardeado na capa estava muito aquém do que era mostrado no filme em si. Separei seis dessas fitas:


A Câmara do Terror (Fear Chamber, 1968)

Direção: Jack Hill, Juan Ibáñez

Com Boris Karloff, Julissa, Carlos East.

A capa aterradora não traduz em absolutamente nada a essência deste filme absurdamente monótono, pobre e risível, com cenários mais modestos que os de Chapolin. Cientistas descobrem uma rocha viva embaixo de um vulcão, a levam para o laboratório e a conectam a computadores, onde ela se comunica com eles. A tal rocha ainda promete revelar segredos vitais e do próprio universo em troca de uma coisa: ser alimentada com o medo de moças. Os cientistas então constroem uma “câmara de medo” e submetem mulheres jovens a sensações de horror, para obterem o fluido do qual a rocha misteriosa se alimenta. Sem dúvida o pior filme do lendário ator britânico Boris Karloff e também sua última atuação em filme exibido ainda em vida. (Três outros filmes com o ator foram lançados postumamente). Pole Video.


Grite, Grite Outra Vez (Scream and Scream Again, 1970)

Direção: Gordon Hessler

Com Vincent Price, Christopher Lee, Peter Cushing.

Três tramas paralelas se desenvolvem simultaneamente: enquanto um ser parece estar atacando garotas na cidade, um ditador descobre uma arma secreta, manipula e mata para ganhar o poder, e um médico insano procura criar uma nova raça de "seres humanos perfeitos". Nada faz muito sentido nesta patacoada. Embora a divulgação do filme tenha sido feita em cima dos três maiores astros do terror da época — Vincent Price, Christopher Lee e Peter Cushing — os três atores têm, na verdade, apenas pequenos papéis no longa. Muitos anos após a realização do filme, Vincent Price disse, em uma entrevista, que nunca entendeu o roteiro. (Certamente ele não foi o único). Baseado no romance The Disorientated Man, de Peter Saxon. Estreou atrasado nos cinemas brasileiros, em 1973, com o título Agonia do Terror. LK-Tel Video.


A Mais Longa das Noites (The Longest Night, 1972)

Direção: Jack Smight

Com: David Janssen, James Farentino, Phyllis Thaxter.

A capa desta fita me fazia imaginar coisas horríveis. O que eu não sabia é que se tratava de um telefilme lançado em vídeo, razão pela qual o filme não tem cenas pesadas e nem chocantes. A narrativa angustiante é o relato do sequestro de Karen Chambers, jovem de família rica. Os sequestradores a mantêm debaixo da terra, em um caixão fabricado em casa. Karen é deixada ali, enterrada viva com um ventilador para ar e um galão de água, enquanto os sequestradores esperam receber o dinheiro do resgate. Originalmente feito para a TV, o filme estreou nos EUA pelo canal ABC, em 12 de setembro de 1972. Baseado no sequestro real de Barbara Mackle, ocorrido em 1968, em Atlanta. Tarantino disse que copiou "descaradamente" este filme no seu Kill Bill: Vol. 2 (2004).


Asilo Sinistro (Asylum / House of Crazies, 1973)

Direção: Roy Ward Baker

Com: Robert Powell, Patrick Magee, Peter Cushing

Definitivamente uma das capas de fitas que mais me assustavam nos anos 1980. Tanto que levei muito tempo até criar coragem de alugá-la. Gostei muito do filme, mas me surpreendi ao perceber que era um tipo de terror mais gótico, sombrio, no qual o terror é sugerido, mas não traduzido em cenas sanguinolentas ou explícitas. Passou na TV com o nome Asilo do Terror.  Já havia falado sobre este filme no post O terror em episódios da Amicus - Parte 1. Globo Video.


Praga Infernal (Bug, 1975)

Direção: Jeannot Szwarc

Com: Bradford Dillman, Joanna Miles, Richard Gilliland

Um terremoto liberta do subsolo baratas assassinas e incendiárias, que espalham pânico e morte em uma cidadezinha rural da Califórnia e ameaçam se alastrar por todo o país. Adaptação fiel do livro A Praga de Hefesto, de Thomas Page (que também co-escreveu o roteiro do filme). Mais uma capa que me assustava, mas o longa não é necessariamente aterrorizante. Está mais para arrastado. Como bem disse Brandt Sponseller, do site Classic-horror.com, "Praga Infernal começa como um filme catástrofe, rapidamente se transforma em um filme de monstros e então evolui para um conto de cientista louco — que acaba sendo a maior parte do filme e que é, em muitos aspectos, sua melhor parte". Sponseller continua: "A principal dificuldade do filme, entretanto, é que é difícil evitar que esse material se torne bobo." CIC Video.


A Casa do Horror (Horror House on Highway Five, 1985)

Direção: Richard Casey

Com: Phil Therrien, Max Manthey, Irene Cagen

A julgar pela capa, eu pensava que o filme me daria calafrios. Ledo engano. A fita é paupérrima, uma produção amadora que não causa um arrepio sequer, mas assusta de tão mal feita que é. Um misterioso assassino, usando uma máscara de Richard Nixon, aterroriza e mata um jovem casal. Um professor passa como tarefa para seus alunos um projeto de investigação dos estranhos eventos relacionados a um cientista nazista possivelmente morto. Os estudantes são sequestrados, mantidos como reféns e torturados. Enquanto isso, "Nixon" continua à cata de mais vítimas. Muitas reviravoltas absurdas em dos filmes de terror amadores mais confusos já feitos, rodado ao longo de vários anos (começou em 1978 e foi até 1985), aos fins de semana. Até apartamentos de vários integrantes do elenco foram usados como locação. Já havia mencionado este filme no post Quatro filmes para morrer antes de ver. Nacional Video.


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Obscuridades do tempo das locadoras

Ruins de verdade

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