17 setembro 2018

Menudo e Chiquitita se encontram


Versões cover de hits do ABBA existem desde que o grupo estava na ativa. Não são novidade para ninguém. Existem centenas delas, dos mais variados cantores e grupos. Cher que o diga. No final deste mês ela lança Dancing Queen, um álbum só com regravações de canções do ABBA, seguindo o sucesso de Mamma Mia! Lá Vamos Nós de Novo (Mamma Mia! Here We Go Again, 2018) e de sua participação no filme.





Regravações em vários outros idiomas também eram (e ainda são) muito comuns no repertório do ABBA. Mas, em janeiro de 1979, quando o ABBA lançou Chiquitita, nem o próprio grupo imaginava que a faixa se tornaria um de seus maiores sucessos e seria tão regravada ao redor do mundo. O próprio ABBA regravou a canção em espanhol naquele mesmo ano e descobriu uma mina de ouro na América Latina. Foi quando se deram conta do potencial que o grupo tinha em territórios de língua espanhola. (No ano seguinte, o quarteto lançaria um álbum inteiro só com versões em espanhol, Gracias Por La Musica.).

Na Argentina, por exemplo, em julho de 1979, o compacto com a versão em castelhano de Chiquitita já tinha vendido 500 mil cópias, contra 25 mil da versão original em inglês. O fenômeno se alastrou rapidamente por toda a América do Sul. Aqui no Brasil, Perla gravou uma versão em português que se tornou hit instantâneo também em 1979: Pequenina. Tanto que até hoje a canção é mais associada a ela no Brasil do que ao próprio ABBA.


Mas o que nem todos sabem é que o Menudo foi o primeiro grupo a regravar Chiquitita em espanhol, depois que o ABBA a gravou naquela língua. Na época, o Menudo era uma boy band infantil de sucesso local. Os meninos ainda não haviam virado febre mundial.

O grupo nasceu em Porto Rico, em 1977, criado pelo produtor Edgardo Díaz. A formação original consistia em dois conjuntos de irmãos: Fernando e Nefty Sallaberry (12 e 13 anos); os irmãos Oscar e Carlos Meléndez, (11 e 12 anos) e Ricky Meléndez (9). Ainda não havia Ricky Martin na jogada. 


O Menudo em 1979
O primeiro LP do grupo, Los Fantasmas, foi lançado em 1977. No ano seguinte, lançaram mais um álbum. Até que, em 1979, com a versão em espanhol de Chiquitita bombando em todos os países de língua espanhola, o Menudo a regravou e fez dela o carro-chefe para seu LP daquele ano. Utilizaram a mesma letra em espanhol que o ABBA gravara, escrita por Buddy e Mary McCluskey. De quebra, os meninos ainda gravaram uma versão em espanhol de Voulez-Vous, também incluída no álbum. O disco marcou a saída de Nefty e a entrada de René Farrait (12) no grupo. (Detalhe: o próprio Menudo, em nova formação, regravou sua versão em espanhol de Voulez-Vous e a relançou em seu álbum de 1981, que continha também versões em espanhol de hits de outros grupos e cantores).



A formação do Menudo foi mudando ao longo dos anos. Mas só na década de 1980 é que ele explodiu no resto do mundo e se tornou fenômeno na América Latina, principalmente na fase em que Ricky Martin (então com 12 anos) passou a fazer parte do grupo (entre 1984 e 1989). 

É curioso notar como a foto de capa do LP Menudo, de 1979 (também chamado de Chiquitita), foi visivelmente inspirada na foto de capa do compacto Chiquitita original, que o ABBA lançara poucos meses antes.

10 setembro 2018

Baila com Village


Umas das coisas que mais gosto em novelas antigas (e  por antigas me refiro àquelas com 30 anos ou mais), além da história em si, é a possibilidade de observar detalhes sem importância, mas que me fazem viajar na maionese. Se os cenários eram bem mais modestos devido às limitações da época, essa simplicidade conferia um realismo maior. Pelo menos na minha opinião. As histórias eram tão envolventes, o texto tão bem escrito e os atores tão bons que os cenários, mesmo módicos se comparados à cenografia hollywoodiana das novelas atuais, ficavam em segundo plano.

É muito fácil assistir às novelas antigas exibidas pelo canal Viva (Dancin’ Days, Pai Herói, Água Viva, A Gata Comeu etc.) e se deliciar com a trama, o elenco e a trilha sonora. Mas, para mim, "pescar bobagens" também é uma delícia. Como em Baila Comigo (1981), sucesso de Manoel Carlos atualmente em exibição pelo canal. No capítulo 13 (03/09/2018), no apartamento de Joana (Betty Faria), notei que um LP do Village People estava bem na frente dos discos da personagem. No capítulo 17 (07/09/2018), percebi que o mesmo LP estava na frente dos discos na casa da personagem Silvia (Fernanda Montenegro).

Sala de Joana (Betty Faria)



Sala de Silvia (Fernanda Montenegro)

Não deixa de ser divertido imaginar (aí entra meu tour pela maionese) que personagens tão distintas entre si ouçam Village People em seus respectivos lares. Nada contra o Village, eu mesmo adoro. Mas acho engraçado imaginar Joana ou Silvia em suas salas, tomando um uísquezinho, enquanto escutam Village People em seus toca-discos.

O tal álbum que aparece ao fundo, nas duas casas, é Live and Sleazy, o último que o grupo lançou na década de 1970. Mais especificamente há exatos 39 anos, em setembro de 1979. O LP, duplo, traz gravações em estúdio (as faixas então inéditas) e outras ao vivo (os hits). Após experimentar dois anos de extrema popularidade e sucesso, com três álbuns, o Village apostou neste Live and Sleazy, mas não foi muito feliz. Na época a disco music já estava sendo sepultada e o grupo — um dos expoentes do movimento — não sobreviveu à onda antidiscoteca.  



Na Europa e na América do Sul, a disco music ainda curtiu uma breve sobrevida, entre 1980 e 1981. Talvez por isso o LP do Village People tenha sido presença constante nas estantes das personagens de Baila Comigo. Ou então foi apenas uma coincidência sem importância. Provavelmente o contrarregra da novela juntava os blocos de LPs e apenas os transportava de um cenário a outro, razão pela pela qual tanto Joana quanto Silvia tenham o Live and Sleazy em lugar de destaque em suas estantes de discos.  


07 setembro 2018

Meu Filho, Meu Mundo (Son-Rise: A Miracle of Love, 1979)


Telefilmesquecidos #7


Raun Kaufman nasce normal e saudável — "como todos os milagres, perfeito!", anuncia o médico, triunfante. Os pais já tinham duas filhas, também saudáveis. Mas começam a perceber, com o passar dos meses, que Raun parece distraído, distante. Muito raramente parece estar ciente do mundo ao seu redor. Descobrem, então, que o filho tem dezenas de sintomas associados ao autismo. E está cada vez mais "sozinho em seu próprio mundo".



Os especialistas mostram-se totalmente pessimistas quanto ao quadro. Os pais, no entanto,  não aceitam o prognóstico precoce e resolvem agir. Decidem, de comum acordo, penetrar no mundo da criança, acreditando que o milagre do amor poderá salvá-la. O filme narra justamente isso: a luta do casal para ajudar Raun e desenvolver suas habilidades cognitivas e afetivas. Por meio de tentativa e erro, desenvolvem um método próprio — um programa de tratamento para o autismo que ficou conhecido como Son-Rise. O nome, em inglês, deve-se às palavras son (filho) e rise (levantar-se, nascer), trocadilho com a palavra sunrise, (nascer do sol).

Os pais de Raun são representados com extrema sensibilidade e credibilidade por James Farentino e Kathryn Harrold. Revezando-se no papel de Raun, os gêmeos Michael e Casey Adams, de 3 anos. Baseado no livro Son-Rise: A Miracle of Love, de Barry Neil Kaufman, pai de Raun, no qual Barry relata toda a trajetória que ele e a esposa percorreram até chegarem à cura do filho, Meu Filho, Meu Mundo era o tipo de telefilme muito em voga na segunda metade da década de 1970. A direção foi de Glenn Jordan. Debby Boone garantiu a canção-tema lacrimejante com Is There Room in Your World for Me?


O filme estreou no canal americano NBC em 14 de maio de 1979 e causou comoção. Foi visto por mais de 300 milhões de telespectadores no mundo todo. Aqui no Brasil, foi exibido pela primeira vez na Globo, em 12 de abril de 1980. O sucesso foi tamanho que a emissora o reprisou duas semanas depois. "Meu Filho Meu Mundo sensibilizou de tal forma o público feminino, quando de sua estreia semana passada, que a TV Globo volta a reprisá-lo, atendendo a grande número de cartas", escreveu Hugo Gomez na seção "Os filmes de hoje" do Jornal do Brasil de 27 de abril de 1980. "Não obstante o enfoque sentimental, inevitável, o filme conta com boas interpretações de Kathryn Harrold e especialmente do garoto Casey Adams, que com sua pouca idade se revela um ator nato."



Por outro lado, o crítico da Folha de S. Paulo da mesma data mostrou-se, digamos, menos entusiasmado: "Telefilme que vai invadindo o vídeo, o que é mais que absurdo: produção do ano passado, nos EUA, chega mais rápido ao público do que os filmes nacionais (há dezenas ainda não lançados desde 1976). Casal tem dois filhos, mas com o nascimento do terceiro, descobre que este sofre de grave doença mental. Terapia resolve tudo."

John J. O'Connor escreveu no New York Times de 14 de maio de 1979: "Meu Filho Meu Mundo é claramente o tipo de produção inspiradora pela qual a televisão se atrai. A história é, de fato, comovente. Mas é preciso cuidado. O autismo é misterioso e doloroso. Ao retratar os médicos como frios e rígidos, em contraste com os Kaufmans, Meu Filho Meu Mundo pode estar criando, de forma cruel, falsas esperanças para outras famílias que lidam com o autismo. O caso de Raun mostrou-se extremamente atípico, fato que não é enfatizado o bastante nesta produção."


A verdade é que a terapia criada pelos pais de Raun Kaufman, leigos, tem obtido grande sucesso até os dias atuais. Hoje Raun é diretor executivo, escritor e professor no Option Institute and the Autism Treatment Center of America e trabalha com pacientes individuais, famílias e grupos, além de ministrar palestras sobre o tratamento do autismo.

Raun Kaufman atualmente


No Brasil, o filme saiu em VHS pela Globo Video.