17 julho 2020

6 (bons) telefilmes de suspense lançados em vídeo no Brasil


Para começo de conversa, o "bons" no título está entre parênteses por se tratar de algo altamente subjetivo. Porém, estes seis telefilmes que selecionei são, de fato, muito bons na minha  opinião. Todos foram produzidos originalmente para a TV, mas ganharam lançamentos em vídeo posteriormente. Todos eles foram também feitos ao longo da década de 1980 e comecinho da de 1990, época em que as fitas e locadoras de vídeo viviam seu auge. Apostando nisso, os produtores não se restringiram às exibições na TV e disponibilizaram os telefilmes em VHS. Àquela altura, o fato de serem filmes feitos para a TV (e, por isso, quase sempre considerados inferiores) não pesava. Até porque a maneira de se produzir filmes para a TV havia evoluído consideravelmente a partir da década de 1980 e, em muitos casos, nem tinham tanta cara de telefilmes. Aqui vai meu Top 6 de suspenses para a TV lançados também em vídeo:


Não Adormeça (Don’t Go to Sleep, 1982) 
Estreia na TV americana: 10 de dezembro de 1982 (ABC)
Estreia na TV brasileira: 25 de maio de 1985 (Globo)
Distribuição em vídeo: Warner Home Video
Direção: Richard Lang
Com Dennis Weaver, Valerie Harper, Robin Ignico, Ruth Gordon


Durante acidente, uma família consegue sair do carro a tempo, exceto Jennifer, a filha mais velha. O irmão havia amarrado os cadarços da menina enquanto ela dormia, e a outra irmã fechara a porta de veículo. Após a tragédia, a família se muda para um bairro afastado. Estranhos incidentes começam a acontecer na nova residência. Para aumentar a tensão familiar, a avó das crianças também vai morar com eles. No caso deste filme, quanto menos você souber, melhor (embora existam pencas de textos e informações online). O ideal é assisti-lo sem ter lido muito sobre ele antes. Fuja de spoilers! Aqui no Brasil, Não Adormeça ficou conhecido e cultuado após as inúmeras reprises nas madrugadas da TV nos anos 1980. Várias cenas marcantes. Ganhou novo fôlego ao ser lançado em VHS. Era figurinha fácil nas prateleiras das videolocadoras. Hoje a fita é considerada uma raridade entre os colecionadores. No elenco, Dennis Weaver e Valerie Harper eram dois rostos mais do que habituais na TV americana. O bônus é por conta de Ruth Gordon, sempre ótima. Oliver Robins, o irmão de Carol Anne em Poltergeist - O Fenômeno (Poltergeist, 1982) também vive aqui o irmãozinho da protagonista. (Poltergeist havia sido lançado cinco meses antes). 




Blackout (Blackout, 1985) 
Estreia na TV americana: 28 de julho de 1985 (HBO)
Estreia na TV brasileira: 27 de abril de 1991 (Globo)
Distribuição em vídeo: VIC Video
Direção: Douglas Hickox
Com Keith Carradine, Kathleen Quinlan, Richard Widmark, Michael Beck


Detetive veterano da polícia suspeita que um corretor de imóveis local, Allen Devlin — que passou por uma reconstrução facial completa após um acidente de carro, no qual também perdeu a memória — pode ser o homem que, anos antes, matou brutalmente esposa e filhos anos antes. Depois do acidente, Devlin recomeçou a vida e casou-se com a enfermeira que o ajudou durante sua recuperação, mas continua sem se lembrar do passado. Muito suspense e pistas falsas (ou verdadeiras?) neste thriller feito para a TV a cabo. Era presença quase obrigatória em toda videolocadora que se prezasse. E era uma das capas que mais me assustava (o olhar por trás da máscara de couro me dava arrepios). Foi bastante reprisado pela Globo ao longo da década de 1990. Na França, Blackout chegou a ser lançado até nos cinemas. Kathleen Quinlan era presença constante em telefilmes e séries. O bônus aqui é o lendário Richard Widmark, indicado ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante por Beijo da Morte (Kiss of Death, 1947) e que ostentou uma prolífica carreira em Hollywood. E para quem não ligou o nome à pessoa, Michael Beck é o par patinador de Olivia Newton-John em Xanadu.




O Aniquilador (Annihilator, 1986)
Estreia na TV americana: 7 de abril de 1986 (NBC)
Estreia na TV brasileira: 15 de setembro de 1990 (Globo)
Distribuição em vídeo: CIC Video
Direção: Michael Chapman
Com Mark Lindsay Chapman, Susan Blakely, Catherine Mary Stewart, Lisa Blount 


O jornalista Robert Armour estranha o comportamento atípico e meio bizarro da sua namorada depois que ela volta do Havaí, para onde viajou com uma amiga, após ganhar um sorteio. Robert descobre que sua namorada não é mais a mesma de antes da viagem. Mas então quem (ou o que) é aquela? Ele precisa descobrir enquanto tenta salvar a própria pele. Aparentemente, os passageiros do tal vôo para o Havaí foram substituídos por humanóides assassinos, meio máquinas, meio humanos, comandados por alienígenas. Enquanto investiga o que aconteceu na viagem, o jornalista é atacado por outros humanóides, chamados de "dinamitados". Mistura de ficção científica e horror, O Aniquilador foi, na verdade, o piloto de uma série de TV que não chegou a ser desenvolvida. Mas o filme concorreu ao Emmy de melhor maquiagem para série de TV da temporada de 1985-86. Uma pena que o projeto da série tenha sido abandonado. Em vez disso, o filme foi lançado em vídeo e ganhou sobrevida nas locadoras mundo afora. A capa me assustava bastante, razão pela qual levei algum tempo para alugá-lo. Mas foi amor à primeira assistida. O Aniquilador deixa muitas perguntas sem resposta, mas ainda assim prende a atenção.




Eu Vi o que Você Fez e Eu Sei Quem Você é (I Saw What You Did, 1988)
Estreia na TV americana: 20 de maio de 1988 (CBS)
Estreia na TV brasileira:10 de novembro de 1993 (SBT)
Distribuição em vídeo: CIC Video
Direção: Fred Walton
Com Shawnee Smith, Tammy Lauren, Candace Cameron Bure, Robert Carradine


Duas amigas estão pernoitando numa fazenda isolada. Como brincadeira, começam a passar trotes telefônicos para pessoas aleatórias, usando a frase "eu vi o que você fez... e eu sei quem você é". Mas uma dessas ligações cai justamente na casa de um maníaco, que passa a persegui-las. Refilmagem para a TV de Eu Vi que Foi Você (I Saw What You Did, 1965), de William Castle, um filme bem fraquinho que, apesar de ter sido lançado dando destaque ao nome de Joan Crawford, contou apenas com uma brevíssima participação da atriz (menos de 10 minutos), na época já vivendo o declínio de sua carreira. Esta versão de 1988 é um dos poucos casos em que o remake, mesmo sendo para a TV, dá de 10 a 0. Muito lembrado até hoje, não só foi bastante reprisado na televisão brasileira como também marcou época nas prateleiras de suspense das videolocadoras. Para quem achou a garotinha Candace Cameron familiar, ela é uma das três filhas do seriado Três é Demais (exibido pela Globo no final dos anos 1980 e pelo SBT na primeira metade da década de 2000). O elenco conta com dois irmãos Carradine: Robert e David. O diretor é o mesmo de Mensageiro da Morte (When a Stranger Calls, 1979) e A Noite das Brincadeiras Mortais (April Fool’s Day, 1986).




Sepultado Vivo / Morto, Mas Nem Tanto (Buried Alive, 1990)
Estreia na TV americana: 9 de maio de 1990 (USA Network)
Estreia na TV brasileira: 1º de dezembro de 1993 (SBT)
Distribuição em vídeo: CIC Video
Direção: Frank Darabont
Com Tim Matheson, Jennifer Jason Leigh, William Atherton


Dado como morto, homem é enterrado vivo, mas consegue escapar. Parece muito absurdo? Mas a coisa piora: o ex-defunto descobre que sua adorável e apaixonada esposa planejou tudo com o amante. Refilmagem para a TV de Obsessão Macabra (Premature Burial, 1962), de Roger Corman, inspirado na obra de Edgar Allan Poe. O elenco é bom e sustenta a história impressionante. Mas a modernização da trama eliminou a atmosfera sombria, peculiar às adaptações de Poe. No entanto, isso não elimina o suspense crescente e a tensão. O curioso é que um outro filme com o mesmo nome (Buried Alive) — também inspirado em Edgar Allan Poe — foi lançado no mesmo ano, com direção de Gerard Kikoine. O título em português foi Enterrado Vivo. Mas não se trata de um telefilme. A confusão aumenta por causa da semelhança com o título Sepultado Vivo, lançado em vídeo aqui no Brasil com o inusitado nome Morto, Mas Nem Tanto.



Retorno Insólito / A Psicose de Mark (The Stranger Within, 1990)
Estreia na TV americana: 27 de novembro de 1990
Estreia na TV brasileira: 15 de dezembro de 1993 (Globo)
Distribuição em vídeo: Vídeo Ban
Direção: Tom Holland
Com Ricky Schroder, Kate Jackson, Chris Sarandon


O filho de três anos da viúva de um veterano da Guerra da Coréia desaparece e nunca mais é encontrado. Até que, 16 anos depois, um jovem aparece misteriosamente na cidade rural onde a viúva mora com o atual marido. O rapaz afirma que é o filho desaparecido. Desconfiada no começo, ela não acredita que possa ser ele. Mas rapidamente o jovem ganha sua confiança, pois sabe muitos detalhes que só mesmo seu filho poderia saber. O suspense prende e o elenco ajuda. Kate Jackson, a eterna Sabrina do seriado As Panteras, vive a mãe do rapaz, interpretado por Rick Schroder — o garotinho que fez o mundo verter lágrimas com O Campeão (The Champ, 1979). E Chris Sarandon vive o marido de Kate Jackson. O diretor Tom Holland, com experiência no campo do suspense/terror, já havia trabalhado com Sarandon em A Hora do Espanto (Fright Night, 1985) e Brinquedo Assassino (Child's Play, 1988). Retorno Insólito é hoje um telefilme raro e pouco lembrado. Mesmo tendo sido lançado em vídeo (rebatizado de A Psicose de Mark), a fita também é raridade entre colecionadores de VHS.

10 julho 2020

Nem só de luz vive um sucesso

Filmes nem sempre permanecem na memória coletiva do público como seus diretores gostariam. Alguns longas só são lembrados por um detalhe específico, seja uma cena marcante e icônica ou a canção-tema. É o caso de Luz da Minha Vida (1977), vítima  desse fenômeno. A maior parte do público nem sequer se lembra de que esse filme não só existiu como também justificou a existência do tema musical homônimo (You Light Up My Life, no original).



Vamos à história: desde pequena, Laurie (Didi Conn) se apresenta em pequenos shows locais de humor, animando festinhas, orientada por seu pai, o comediante Si (Joe Silver). O único sonho de Si é ver a filha seguir seus passos. Mas Laurie não leva o menor jeito para a coisa. Sua real vocação é cantar e atuar. No entanto, para não desapontar o dedicado pai, que a criou sozinho, Laurie sujeita-se a fazer os batidos e sem graça números de comédia stand up dirigidos por ele. Paralelamente, grava jingles para campanhas publicitárias e faz pequenos bicos.


Até o dia em que conhece Chris Nolan (Michael Zaslow) em um bar, totalmente por acaso, e se rende a seus galanteios. O simpático (e insistente) sujeito lhe rouba um beijo e os dois acabam passando a noite juntos, na casa de Chris. No dia seguinte, a vida volta ao normal: meio sem jeito, Laurie confessa que é noiva e está de casamento marcado, agradece a noite e despede-se de Chris. Mesmo interessado em Laurie, ele é obrigado a se conformar. Cada um segue seu caminho.



O pequeno fato serve de gatilho para Laurie se questionar sobre como tem conduzido sua vida. Além de se arrastar em uma rotina profissional que não é a que ela deseja, seu noivado com o treinador de tênis Ken (Stephen Nathan) também é desprovido de empolgação e de desejo real. E Laurie sente que sua vida pode estar descambando para o caminho errado.

Dias depois, Laurie aparece em um estúdio para gravar uma música e descobre que Chris é diretor de cinema. Uma oportunidade inimaginável surge para Laurie. Como teste, ela grava sua música em um estúdio profissional pela primeira vez, com acompanhamento de orquestra e tudo. Chris e a equipe se impressionam com a qualidade do trabalho de Laurie. É quando ele sugere que ela poderia também atuar no filme que ele está prestes a dirigir. E agora, o que fazer? Agarrar a rara oportunidade e dar adeus aos sonhos do pai? Desfazer o noivado, às vésperas do casamento com Ken, e ficar com Chris?

 

O filme, que estreou nos EUA em 31 de agosto de 1977, é uma história romântica que, apesar de sua modesta produção, revela-se até envolvente. A familiar premissa da jovem correndo atrás de seu sonho continua atraente, ainda mais quando há romance envolvido. Didi Conn — cujo rosto tornou-se conhecido no ano seguinte, em Grease - Nos Tempos da Brilhantina, vivendo a atrapalhada Frenchy — empresta sua doçura e carisma à protagonista de Luz da Minha Vida. Mas o grande feito deste longa foi mesmo ter lançado um dos maiores sucessos românticos da música americana, You Light Up My Life (mesmo nome do filme), imortalizada na voz de Debby Boone e ganhadora do Oscar de Melhor Canção Original de 1977. 


Aliás, aquele foi um ano singular em matéria de temas musicais no cinema. A escolha da excessivamente sentimental You Light Up My Life, cantada por Debby Boone, como Melhor Canção Original, no Oscar de 1978, divide opiniões. Foi uma daquelas ocasiões estarrecedoras em que a Academia ignorou tanto a lendária Theme From New York, New York quanto a trilha sonora inteira de Os Embalos de Sábado à Noite, que nem chegaram a entrar na disputa. Vai entender… Para completar, You Light Up My Life venceu nada menos que Nobody Does It Better, de Carly Simon — tema do filme 007 - O Espião Que Me Amava (The Spy Who Loved Me). Um vitória altamente questionável.

Joseph Brooks


Kvitka Cisyk (primeira à esquerda) no set de gravação

Composto por Joseph Brooks e cantado por uma tal Kvitka Cisyk, o pegajoso hit de Debby Boone ficou conhecido do público pela primeira vez como parte do filme, que também foi escrito, produzido e dirigido por Brooks. No filme, Cisyk fornece a voz para Didi Conn. Debby Boone, por sua vez, regravou a canção para um LP próprio, depois que o filme foi concluído. No Brasil, o nome de Debby não chegou a se tornar tão conhecido como a canção, mas em seu país natal, os EUA, a cantora ficou extremamente popular quando lançou-se em carreira solo, em 1977, com o álbum (adivinha?) You Light Up My Life.


De acordo com a revista People de 28 de novembro de 1977, Kvitka "Kacey" Cisyk,  além de ter emprestado a voz para Didi Conn, também fez uma participação-relâmpago no filme, como uma das damas de honra da história. Quando a Arista Records lançou o compacto e a trilha sonora do filme, Cisyk aparecia nos créditos como integrante do "Elenco original." Logo depois, Debby Boone também gravou You Light Up My Life para a Warner Bros. Records usando a mesma trilha instrumental de Joseph Brooks, que havia sido utilizada no filme. A versão original de Cisyk fez um pequeno sucesso, ao passo que o compacto com a versão de Debby Boone alavancou a faixa e explodiu no mundo todo. Ficou em primeiro lugar nas paradas americanas por nada menos do que dez semanas consecutivas, tornando-se o compacto de maior sucesso da década de 1970. Em uma entrevista para a revista Entertainment Weekly, em 2003, Debby admitiu: "Não tive liberdade alguma. Joe [Joseph Brooks] me falou exatamente como cantar e como imitar cada inflexão da gravação original".

Debby segurando o Grammy de 1978 com o pai, Pat Boone

Quando o filme foi lançado, ganhou muita divulgação e promoção, em conjunto com o lançamento da canção. No entanto, ao que parece, a campanha de lançamento de Luz da Minha Vida prometeu mais do que conseguiu alcançar no resultado final. O público não caiu de amores pelo filme e sim pela música. 


A faixa You Light Up My Life foi um verdadeiro fenômeno. Além de ter permanecido por dez semanas no topo das paradas, faturou o Grammy e o Golden Globe (além do Oscar de Melhor Canção Original). "Já perdi a conta. Não sei dizer em quantos casamentos cantei essa música”, disse Debby Boone, décadas depois. "Ao longo dos anos, muitos DJs vinham até mim para dizer que não aguentavam mais tocar esse disco".

Em 1978, a canção entrou na trilha internacional da novela Dancin’ Days, de Gilberto Braga (embora sua execução na novela tenha sido inexpressiva). Mas o filme só estreou aqui no Brasil em junho de 1979, no Rio, e em fevereiro de 1980 em São Paulo. A coluna Estreias da semana, do jornal O Globo, de 24 de junho de 1979, resumiu o espírito da coisa: "Em Luz da Minha Vida, a canção You Light Up My Life, recordista em paradas de sucesso e da autoria do diretor Joseph Brooks (Oscar de Melhor Canção em 1978), é a principal estrela do espetáculo." 



Quando o filme foi exibido na TV aqui no Brasil, em 1981, Fernando Morgado, em sua coluna Filmes na TV, da Folha de S. Paulo, foi menos comedido: "O outro [filme] inédito do Canal 13, bem mais modesto, é o drama do mundo artístico Luz da Minha Vida, que consegue ser lembrado ainda hoje apenas por sua música You Light Up My Life, que a filhinha cantora de Pat Boone, Debbie, tão chatinha como a canção, conseguiu levar até a noite do Oscar de anos atrás e sair com o prêmio principal." (Folha de S. Paulo, 14 de dezembro de 1981)

Após a explosão com a canção que lhe rendeu uma penca de prêmios e sucesso que correu o mundo, Debby Boone direcionou sua carreira para a música country. Na década de 1980, voltou-se para a música cristã e abocanhou mais alguns Grammys. A quem interessar possa, Debby — terceira das quatro filhas do ator e cantor Pat Boone — e as irmãs começaram cantando música gospel com seus pais, sob o nome The Pat Boone Family e, depois, The Boones. O grupo chegou a figurar nas paradas americanas em 1975, com When The Lovelight Starts Shining Through His Eyes, cover de um antigo hit das Supremes, e em 1977 com Hasta Mañana, cover da faixa que o ABBA havia lançado três anos antes, no álbum Waterloo. (Hasta Mañan foi, inclusive, o lado B do compacto You Light Up My Life, de Debby).


The Boones: Debby (primeira à esquerda) e suas irmãs

A canção You Light Up My Life pode ter sido a estrela que ofuscou o filme homônimo, mas o colossal sucesso da faixa foi manchado décadas depois, de forma sombria. Joseph Brooks, que em 1978 recebera o Oscar pela composição da canção, acabou caindo na obscuridade logo depois do filme. Ex-criador de jingles, Brooks voltou a ganhar destaque na mídia 30 anos depois de seu Oscar, mas por um motivo nefasto. Em junho de 2009, foi preso e acusado de ter armado falsas chamadas de elenco e assediado sexualmente e/ou estuprado quase uma dúzia de mulheres. (Kvitka "Kacey" Cisyk estava as mulheres assediadas por Brooks. Por ter recusado suas investidas, Kvitka sofreu retaliação do diretor e não recebeu o devido pagamento pelo uso de sua voz na gravação original de You Light Up My Life. A cantora levou décadas para conseguir, na Justiça, o devido pagamento). Outras denúncias contra Brooks surgiram, referentes a assédios que vinham sendo cometidos há mais de 40 anos. O diretor cometeu suicídio em 2011, enquanto ainda aguardava julgamento.

Joseph Brooks

03 julho 2020

O Resgate de Jessica (Everybody's Baby: The Rescue of Jessica McClure, 1989)


Telefilmesquecidos #23

Um minuto. Esse foi o tempo que Cissy McClure (Roxana Zal) levou para correr do quintal até o telefone, que tocava na sala, e atendê-lo. A ligação logo foi encerrada e Cissy voltou para o quintal da casa da irmã, onde cuidava de algumas crianças, incluindo sua filhinha Jessica, de apenas 18 meses. Mas a bebê havia sumido e a pedra que cobria o estreito cano de um poço estava fora do lugar. Começa o desespero.


Com os serviços de emergência e a mídia vasculhando o quintal, tem início a conturbada missão de resgate. A pequena Jessica estava presa dentro do cano de 20 centímetros de diâmetro, a cerca de seis metros de profundidade. Várias ideias são apresentadas, até que se decide construir um túnel paralelo ao cano, em uma angustiante corrida contra o tempo. Mas o resgate exigiria extremo cuidado, pois as vibrações no chão poderiam fazer com que Jessica escorregasse para mais fundo. Toda a cidade se reúne, oferecendo ajuda e se envolvendo pessoalmente no resgate. A comunidade não arredou pé do local.


Roxana Zal como Cissy, mãe de Jessica


A história é baseada em fatos reais e aconteceu em Midland, no Texas, em  14 de outubro de 1987. Por mais de dois dias, os americanos ficaram paralisados com o fato, acompanhando em crescente tensão as tentativas de resgate de Jessica. O salvamento da bebê mobilizou todos os meios de comunicação do país, com a população assistindo e torcendo por um desfecho vitorioso. Demorou 58 horas, mas Jessica foi retirada do poço com segurança.

Will Oldham e Roxana Zal



O diretor Mel Damski tem vasta experiência na TV. Dirigiu dezenas de episódios de séries (Ally McBeal, Jovens Bruxas, Dawson's Creek etc.) e vários telefilmes. O elenco é cheio de nomes conhecidos, como Pat Hingle (um dos únicos atores a aparecer em todos os quatro filmes do Batman lançados por Tim Burton e Joel Schumacher, entre 1989 e 1997), Patty Duke (extremamente popular nos EUA, ganhadora mais jovem do Oscar em sua época, por O Milagre de Anne Sullivan) e Beau Bridges (famoso por atuações no cinema e na TV, filho de Lloyd e irmão de Jeff Bridges). Os fãs de Twin Peaks vão notar que Walter Olkewicz, que interpreta um dos policiais em O Resgate de Jessica, é o Jacques Renault da série de David Lynch. O papel da bebê Jessica ficou com as gêmeas Laura e Jennifer Loesch, que se alternaram nas gravaçõess. 

Beau Bridges e Pat Hingle

Walter Olkewicz

Patty Duke

Um dos mais populares telefilmes sobre crianças envolvidas em acidentes graves, O Resgate de Jessica estreou nos EUA em 21 de maio 1989, no canal ABC. Aqui no Brasil, a estreia foi (quase) exatamente dois anos depois, em 18 de maio de 1991, na Globo. A emissora exibiu o filme, com bastante divulgação, naquela noite de sábado — quando foi ao ar o último capítulo da novela Meu Bem, Meu Mal, seguido pela Escolinha do Professor Raimundo e, finalmente, Supercine, com O Resgate de Jessica.

Jennifer Loesch como Jessica

Chamada de estreia do filme

Jessica McClure até hoje é lembrada e conhecida nos Estados Unidos como "Baby Jessica". Hoje, aos 34 anos, Jessica é mãe e disse à revista People (outubro de 2019) não ter lembrança alguma do ocorrido. "A primeira vez que descobri que eu era a Baby Jessica, tinha uns cinco anos de idade", contou ela. "Costumava assistir a um programa chamado Emergência 911 e me lembro de pensar 'meu Deus, que horror… deve ter sido terrível para essa criança'". E ela nem imaginava que o caso mostrado no programa era o seu próprio. "Lembro de me explicarem que aquela era eu e comecei a chorar", recorda-se Jessica.

A verdadeira Jessica, em 2019