23 novembro 2022

Djavan em Anjo Mau (1976)

Uma das coisas mais divertidas ao assistir a novelas antigas são as surpresas curiosas nas quais a gente esbarra. Atualmente assistindo à primeira versão de Anjo Mau (1976), de Cassiano Gabus Mendes, na Globoplay, me deparei com ninguém menos que Djavan.


Não, não tem nenhuma faixa do Djavan na trilha sonora de Anjo Mau. Mas o cantor (que na época ainda não era famoso) apareceu no capítulo 22 (exibido originalmente em 26 de fevereiro de 1976), bem no primeiro mês da novela.


Ele aparece rapidamente, só por alguns segundos, na cena em que Rodrigo (José Wilker) leva Nice (Susana Vieira) à boate 706, no Leblon, Zona Sul carioca. Na boate estão também Ricardo (Luiz Gustavo) e Paula (Vera Gimenez).


Djavan (de camisa xadrez, de costas)

Na banda, que tocava e cantava ao vivo na casa noturna, estava ninguém menos que Djavan. O grupo cantou If I Ever Lose This Heaven, sucesso recente de Quincy Jones na época. A faixa faz parte do álbum Body Heat, lançado pelo selo A&M em 1974.



Enquanto se desenrola a ação entre os personagens, Djavan canta, junto com o grupo, outro hit da época: Feel Like Making Love, de Roberta Flack, do álbum homônimo lançado pela cantora em 1975.


Então com 27 anos, o cantor, natural de Maceió, havia chegado ao Rio de Janeiro poucos anos antes, para tentar a sorte no mercado musical. Foi naquele período que Djavan trabalhou como crooner de boates famosas como a Number One e a 706. 

Djavan na 706

A biografia do cantor, em seu site oficial, conta:

Com a ajuda de Edson Mauro, radialista e conterrâneo, conhece João Araújo, presidente da Som Livre, que o leva para a TV Globo. Passa a cantar trilhas sonoras de novelas, para as quais grava músicas de compositores consagrados como "Alegre Menina" (Dori Caymmi, com letra de Jorge Amado), da novela Gabriela, "Qual é" (Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle), da novela Os Ossos do Barão (1973), e "Calmaria e Vendaval" (Toquinho e Vinícius de Moraes).

Em três anos, entre 1972 e 75, nas horas vagas do microfone, compõe mais de 60 músicas, de variados gêneros. Com uma delas, o samba “Fato Consumado”, tira segundo lugar no Festival Abertura, realizado pela TV Globo em 1975, e chega ao estúdio da Som Livre. De lá sai com seu primeiro disco, das mãos do mítico produtor (de Carmen Miranda a Tom Jobim) Aloysio de Oliveira. A voz, o violão, a música de Djavan, de 1976, é um disco de samba sacudido, sincopado e diferente de tudo que se fazia na época. 

A 706 ficava na rua Ataulfo de Paiva, uma das principais do Leblon. A boate era também chamada de Piano Bar 706 e o local era frequentado por músicos, artistas e cantores renomados, além da elite carioca. Curiosamente, Djavan já havia aparecido — também cantando na 706 — na novela Corrida do Ouro, de Lauro César Muniz e Gilberto Braga, exibida pela Globo entre 1974 e 1975.  

Djavan em Corrida do Ouro (1974)

Como o próprio Djavan explica, entrevistado por Irlam Rocha Lima para o jornal Correio Braziliense em 2017:

"Por três anos, eu cantei na noite carioca, nas boates Number One e 706. Eu era crooner da banda de Osmar Milito, músico de muito prestígio. Mas eu só me tornei conhecido naquele meio."

"Inicialmente, não tive facilidade. Não conhecia ninguém, mas procurei me situar. O Adelson Alves era um radialista famoso naquela época que apresentava o programa O amigo da madrugada, na Rádio Nacional. Fui à emissora incontáveis vezes para mostrar o que estava fazendo. Até que um dia, me ouviu cantar. Mas me desencorajou, ao dizer que seu programa era voltado para o samba tradicional e que a música que eu fazia não se adequava à programação. Aí sugeriu que eu procurasse o João Melo, na Som Livre."


Com o LP A voz, o violão e a arte de Djavan, lançado em 1976, Djavan emplacou a música Flor de Lis e deu início à sua carreira de sucesso, tornando-se um dos maiores cantores da música popular brasileira.

18 novembro 2022

Os Dois Mundos de Jennie Logan (The Two Worlds of Jennie Logan, 1979)

Telefilmesquecidos #53

Jennie Logan (Lindsay Wagner) muda-se com o marido Michael (Alan Feinstein) para uma velha mansão na fictícia cidade de Chesapequa, nos arredores de Nova York. A história se passa na época atual do filme, em 1979. O casal está tentando começar de novo, após Jennie ter descoberto uma traição do marido. Apesar de dizer que o perdoou, ela não consegue esquecer o caso.

Logo depois de se mudarem, Jennie encontra um antigo vestido branco no sótão. Insatisfeita com o casamento, ela passa a vivenciar situações fantásticas quando veste o velho traje recém-achado. Começa a ter visões de pessoas e da casa em tempos passados. Durante essas visões, Jennie descobre-se em pleno século 19, encarnada na imagem de uma certa Pamela. E conhece um homem estranho, David Reynolds (Marc Singer), que a confunde com a tal Pamela e clama por ela, em desespero. 

Jennie (Lindsay Wagner) e Michael (Alan Feinstein)

Lindsay Wagner

O vestido é o gatilho para Jennie experimentar uma realidade completa e alternativa, ocorrida 80 anos antes. Nessa outra realidade, David lamenta a perda de seu amor, Pamela, enquanto afasta o afeto de outra mulher, Elizabeth Warrington (Linda Gray).

Em sucessivas voltas ao passado, Jennie acaba conhecendo melhor David, antigo morador da casa. O pintor havia sido dado por desequilibrado após o estranho desaparecimento da noiva, Pamela, logo depois do casamento. O próprio David morreu em circunstâncias misteriosas, durante um duelo com seu padrasto, em 31 de dezembro de 1899, no baile de réveillon da passagem do século. 

David (Marc Singer)

Elizabeth (Linda Gray)

Sentindo-se amorosamente atraída por David, que materializa seus sonhos românticos, Jennie se afasta cada vez mais de sua vida presente e de Michael. Também não encontra respostas satisfatórias para suas "alucinações" na ajuda psiquiátrica. 

Nesta "outra vida" no passado, Jennie acaba sabendo que o sogro de David, Mr. Harrington (Henry Wilcoxon), o acusava de ter assassinado Pamela para obter a herança familiar. Descobre também que a cunhada do pintor, Elizabeth, nutria por ele um amor obsessivo e não correspondido. Investigando o caso no tempo atual e no passado, Jennie busca decifrar a morte de David. Mais que isso, tenta evitar o ocorrido e levar uma vida plena e feliz, em companhia do homem amado.


A questão então é se Jennie realmente vê e participa dessa realidade ou se estaria tudo apenas em sua cabeça. Seria uma projeção para uma vida e um amor que ela já teve, ou pensou que tinha e perdeu?

Baseado no romance Second Sight, de David L. Williams, publicado em 1977. Curiosamente, nunca foi traduzido aqui no Brasil. A direção e o roteiro (baseado no livro) são de Frank De Felitta, que havia dirigido As Duas Vidas de Audrey Rose (Audrey Rose, 1977) no cinema.

O elenco é bom e o destaque é para Lindsay Wagner no papel-título. A atriz era conhecida pelo seriado A Mulher Biônica (The Bionic Woman, 1976-1978), que fez grande sucesso na década de 1970. Linda Gray, a eterna Sue Ellen de Dallas (1978-1991), também se destaca, em um papel de época, bem diferente da personagem que vivia em Dallas.

Impossível não notar a semelhança entre este telefilme e o conhecido e popular Em Algum Lugar do Passado (Somewhere In Time, 1980), estrelado por Christopher Reeve e Jane Seymour. 

Há notáveis semelhanças entre Os Dois Mundos de Jennie Logan e Em Algum Lugar do Passado (que estreou nos cinemas americanos em 3 de outubro de 1980). Ambos têm um enredo quase idêntico, com a diferença de que, no segundo caso, era o homem viajando no tempo para reviver o romance com a moça. Um feito para a TV, outro feito para o cinema. Duas obras muito semelhantes, lançadas com quase exatamente um ano de diferença, ambas baseadas em diferentes livros, mas muito similares entre si, que também foram escritos e publicados mais ou menos na mesma época.

Em Algum Lugar do Passado é baseado no romance de Richard Matheson, publicado originalmente com o título de Bid Time Return, em 1975, e mais tarde republicado como Somewhere in Time

Os Dois Mundos de Jennie Logan estreou na TV americana em 31 de outubro de 1979, noite de Halloween, pela CBS. Na TV brasileira, foi exibido pela primeira vez em 31 de julho de 1982, na sessão Primeira Exibição, da Globo.


Na Folha de S. Paulo de 31 de julho de 1982, a sinopse informava que "os críticos americanos gostaram desta curiosa mistura de romance, crime, mistério e sobrenatural feito para a televisão."

Na coluna Os filmes de hoje, do Jornal do Brasil da mesma data, Hugo Gomez destacou que o filme "tem uma história fantástica que, se for bem desenvolvida, poderá agradar aos espíritos românticos". Mas concluiu que "tudo leva a crer que não passa de produção superficial, enfeitada pela beleza de Lindsay Wagner".

Os Dois Mundos de Jennie Logan foi lançado em VHS no Brasil em 1987. Em 2022, a distribuidora Obras-Primas do Cinema lançou o filme em DVD aqui, em edição caprichada.


11 novembro 2022

Sacrifícios Inúteis (Before and After, 1979)

Telefilmesquecidos #52

“Você não é gorda, só precisa perder alguns quilos,” diz Jack (Bradford Dillman), marido de Carole (Patty Duke). Na verdade, o casal passa por uma crise. Jack chegou aos 40 e dá sinais claros de desinteresse pela esposa, cuja autoestima não é das melhores.

Lá pelas tantas, Jack sai de casa e abandona Carole, que passa a viver reclusa, em companhia da mãe. Sentindo-se gorda e fisicamente desprezada, compartilha seus dramas com as amigas Penny (Barbara Feldon) e Marge (Conchata Ferrell). Penny é obcecada por emagrecimento e nem seus sacrifícios impediram que o marido também a abandonasse. 


Marge, por outro lado, é gordinha e feliz em seu casamento. Mas Carole, em vez de confiar no otimismo de Marge, entra na paranoia de Penny e passa a frequentar um grupo de emagrecimento, espécie de “Gordos Anônimos”. O tal grupo, no entanto, impõe humilhações aos participantes tais como usar máscaras de porco.



Ainda descontente, Carole resiste até mesmo às paqueras do bonitão Mike Farmer (Art Hindle), jovem artista com quem tem contato na escola de arte para cegos onde ensina. Com o apoio das amigas, Carole refaz sua forma física, por meio de dieta para melhorar a estética e ginástica. Finalmente, aceita as atenções amorosas de Mike e os dois iniciam um romance sincero.



Patty Duke

Mas Carole descobre que beleza física, de fato, não traz felicidade. E, quando Jack reaparece querendo refazer o casamento (depois de ver a “nova versão” de Carole), ela tem que escolher: retornar ao passado problemático ou seguir em frente com sua nova independência? 

Este telefilme expôs claramente o impacto que a comida e o peso tinham na vida das mulheres, naquele final de década de 1970. O problema ainda existe, mas hoje é conhecido e tratado de outra forma.

Apesar do bom elenco, Sacrifícios Inúteis ficou extremamente datado. Não se trata de um filme ruim, mas a música cafona e os diálogos previsíveis não ajudam. Usa também estereótipos e conceitos machistas – o que na época era algo naturalizado. Embora os transtornos alimentares já existissem, eram retratados de maneira diferente e não eram conhecidos como hoje. No filme, as palavras "distúrbio alimentar" nunca foram pronunciadas, mas a mensagem era clara. 

Patty Duke era uma atriz sensacional. Mas aqui ela interpreta uma mulher supostamente acima do peso, o que é meio difícil de engolir. Talvez, por isso, quase todos no filme digam à sua personagem que ela está acima do peso. Provavelmente para que o telespectador também acreditasse.


Sacrifícios Inúteis não está entre os melhores filmes de Patty Duke – e ela fez vários muito bons – mas funciona como curiosidade sobre um tempo (não muito distante) em que questões como o corpo feminino, padrões de beleza e distúrbios alimentares eram tratadas de forma bastante cruel.

Conchata Ferrell e Barbara Feldon 

Duke, Barbara Feldon e Conchata Ferrell funcionam maravilhosamente juntas como as três amigas. Aliás, a presença de Conchata Ferrell (a Berta do seriado Dois Homens e Meio) é um deleite. Pena que, por culpa do roteiro, as personagens não tivessem nada mais interessante para discutir além de homens e peso.

Participação rápida de Betty White no papel de “coach” do absurdo grupo de emagrecimento. Betty é mais conhecida no Brasil pelo seriado Supergatas (The Golden Girls), que foi ao ar entre 1985 e 1992.

Betty White

Primeiro telefilme da diretora Kim Friedman, que na época já havia dirigido algumas séries de TV. A estreia de Sacrifícios Inúteis na TV americana foi em 5 de outubro de 1979, na ABC. No Brasil, foi ao ar pela primeira vez em 14 de outubro de 1981, na Globo, na sessão Première 81.

Não confundir com Antes e Depois, filme de 1996 estrelado por Meryl Streep e Liam Neeson, cujo título original também é Before and After

04 novembro 2022

Dias de Violência (Too Young to Die?, 1990)

Telefilmesquecidos #51

A adolescente Amanda Sue Bradley (Juliette Lewis), rejeitada pela mãe e violentada pelo padrasto, resolve fugir de casa. Imatura e perdida, passa a viver nas ruas, onde conhece o marginal drogado Billy (Brad Pitt). Os dois começam um caso e ele a coloca para trabalhar em um bar de strip-tease, com o intuito de prostituí-la e explorá-la.

O filme começa com Amanda presa, condenada à câmara de gás. Ainda não sabemos por que ela está ali. A história é contada em flahsback. Logo fica claro o motivo pelo qual a menina caiu em desgraça.  

Entre tipos de caráter suspeito, a jovem até encontra algumas pessoas boas, interessadas em ajudá-la. Mas a ingenuidade de Amanda complica ainda mais sua história. Ela acaba conhecendo, casualmente, o soldado Mike (Michael O'Keefe). O homem sente pena Amanda e a convida para morar em sua casa, contanto que ela se afaste daquele mundo de drogas e prostituição.



Embora ainda seja praticamente uma criança, Amanda (então com 14 anos) e Mike (20 anos mais velho) começam um relacionamento. Mike é divorciado e tem dois filhos pequenos. À sua maneira infantil, Amanda se sente acolhida e feliz em cuidar da casa de Mike e levar uma vida “normal”.


Ao descobrir, Billy conta ao comandante de Mike sobre o caso. O soldado, temendo perder seu posto de trabalho e o direito de ver os filhos, rompe o relacionamento com Amanda. A menina volta às ruas, ainda mais desiludida e revoltada, e cai novamente nas garras de Billy. Influenciada pelo marginal, Amanda agora quer se vingar de Mike. Mas a vingança foge do controle.

Brad Pitt e Juliette Lewis começaram a namorar durante as filmagens deste telefilme, em 1989. Ela com 16 anos e Brad com 26. O relacionamento durou quatro anos. Os dois voltaram a trabalhar juntos em Kalifornia: Uma Viagem ao Inferno (1993). 

Dirigido por Robert Markowitz, com vasta experiência em TV. Embora ambientado em Oklahoma, o filme é livremente baseado em um caso ocorrido em Harrison County, Mississippi, em 1982.

Juliette Lewis e Brad Pitt ainda não eram astros mundialmente famosos na época. Mas já davam mostras de que fariam carreira em Hollywood.

Brad havia participado de alguns seriados e telefilmes, mas sua fama começaria, de fato, com Thelma & Louise (1991). Juliette Lewis, por sua vez, já havia participado de alguns filmes, mas começou a ser notada a partir de O Cabo do Medo (Cape Fear, 1991). Curiosamente, tanto Pitt quanto Lewis começaram a ganhar projeção internacional no mesmo ano, 1991.


Lançado em vídeo nos EUA e, posteriormente, em DVD. Saiu em DVD por aqui também, na época em que os DVDs enchiam bancas e lojas. (O velho oportunismo de catar filmes antigos e desconhecidos do começo da carreira de artistas que depois ficaram famosos). Chegou a ser lançado na coleção da revista Caras e também em edições igualmente baratas, duplas, como aquelas que eram muito comuns nas Lojas Americanas.

Dias de Violência estreou na TV americana em 26 de fevereiro de 1990, pela NBC. Mas demorou a estrear na TV brasileira: só em 4 de setembro de 1998, na Globo.