Telefilmesquecidos #49
Um dos crimes mais famosos da história americana diz respeito a Lizzie Borden, uma solteirona de 32 anos de Massachusetts, acusada de matar o pai e a madrasta a machadadas, em 1892.
O filme entrelaça cenas de julgamento e flashbacks, revelando, aos poucos, a natureza da relação distorcida de Lizzie (Elizabeth Montgomery) com seu pai, Andrew (Fritz Weaver). Fanático e malicioso, ele vivia repreendendo a filha, mesmo depois de adulta. Chega até a matar os pássaros de estimação de Lizzie, aparentemente pelo simples prazer de infligir dor.
O filme retrata todos os momentos-chave do registro histórico do julgamento e também usa a licença criativa para explorar a mente de Lizzie. Esta versão mostra Borden como uma mulher que sofreu abuso e revidou em um momento de insanidade temporária.
Elizabeth Montgomery |
Fritz Weaver |
Mas as evidências são confusas. Se Lizzie cometeu os crimes, por que não foi encontrado sangue em suas roupas ou em si mesma? Como ela poderia ter cometido assassinatos daquele tipo sem deixar nenhuma evidência física para trás? E, não menos importante: qual teria sido exatamente a motivação de Lizzie?
Há ainda a presença da governanta Bridget Sullivan (Fionnula Flanagan), que suspeita que Lizzie cometeu os assassinatos, e da irmã de Lizzie, Emma (Katherine Helmond), que teme o pior, mas espera o melhor.
Katherine Helmond |
Fionnula Flanagan |
No julgamento, um intrincado quebra-cabeça foi reorganizado para expor a possível versão do crime. Culpada ou inocente? No final das contas, não temos certeza de nada, do que é real ou imaginário, e tampouco do estado mental de Lizzie. Embora o filme a retrate cometendo os assassinatos, na vida real ela foi absolvida, principalmente porque nenhum júri em 1893 (ano em que foi julgada) poderia acreditar que uma mulher pudesse cometer tal selvageria.
Lizzie herdou a propriedade do pai e viveu no luxo e reclusão até sua morte, em 1927. Mas, assim como aconteceria com O.J. Simpson um século depois, Lizzie foi amplamente considerada culpada e condenada ao ostracismo pela sociedade. Seja a especulação verdadeira ou não, o filme faz um trabalho eficaz ao vendê-la, e é altamente envolvente.
Tudo é complementado pelo forte desempenho de Elizabeth Montgomery. Sua Lizzie Borden não é mentalmente estável, mas também não é tola, e há uma frieza assustadora em sua interpretação que faz o telespectador acreditar que ela realmente pode ser culpada. A atuação de Fritz Weaver como seu pai (em flashbacks) também é muito boa.
Montgomery ficou muito conhecida pelo papel de Samantha, no seriado A Feiticeira (Bewitched, 1964-1972). Extremamente popular, A Feiticeira se tornou um clássico da TV. Quando estrelou A Lenda de Lizzie Borden, o término da série ainda era relativamente recente. Elizabeth, no entanto, nem de longe lembrava a carismática feiticeira do seriado, provando que era uma atriz de mão cheia.Seu desempenho ousado contribuiu muito para o sucesso do filme.
A versão do filme para os cinemas europeus mostra Elizabeth Montgomery nua, durante a cena em que ela mata os pais, na qual aparece coberta de sangue, segurando um machado. Na versão da ABC, a edição cuidadosa sugere sua nudez, mas nunca realmente a mostra.
Escrito por William Bast e dirigido por Paul Wendkos. Aliás, Wendkos tem um extenso e respeitável currículo de trabalhos na TV desde a década de 1950, incluindo centenas de episódios de seriados e telefilmes. A Irmandade do Sino (The Brotherhood of the Bell, 1970), A Morte da Inocência (A Death of Innocence, 1971) e Terror na Praia (Terror on the Beach, 1973) são só alguns deles, além do longa Balada Para Satã (The Mephisto Waltz, 1971), feito para o cinema.
O filme rendeu ao roteirista William Bast o Prêmio Edgar de 1975 de Melhor Longa-Metragem/Minissérie de TV. O filme também ganhou dois prêmios Emmy, por Figurino e Edição, e recebeu indicações em três outras categorias: Atriz Principal (Montgomery), Direção de Arte e Edição de Som.
A Lenda de Lizzie Borden, como bem pontuou Paul Mavis, do site Drunk TV, “(...) é um dos melhores filmes feitos para a TV nos anos 1970 — e isso não é pouco, considerando que foi lançado durante a ‘era de ouro’ desse formato.”
A história ganhou várias adaptações, entre elas a minissérie The Lizzie Borden Chronicles (2015), do canal Lifetime, estrelada por Christina Ricci. A ideia surgiu do telefilme A Arma de Lizzie Borden (Lizzie Borden Took an Ax, 2014), também protagonizado por Ricci.
Nos EUA, a estreia do filme foi em 10 de fevereiro de 1975, na ABC. Antes da exibição, um aviso alertava os telespectadores: "Devido ao conteúdo adulto, recomenda-se discernimento dos pais."
No Brasil, foi exibido pela primeira vez em 5 de março de 1977, na Globo.
Segundo Caderno (O Globo), coluna Os filmes da semana - Paulo Perdigão (27/02/1977) |
Nenhum comentário:
Postar um comentário