15 junho 2020

Drama de Uma Adolescente (Sarah T. - Portrait of a Teenage Alcoholic, 1975)


Telefilmesquecidos #20

Não é novidade: ninguém passou por mais tormentos nos anos 1970 do que Linda Blair, seja na tela do cinema ou da TV. Enquanto outras jovens atrizes faziam filmes sobre as alegrias e dores do primeiro amor, ou sobre a busca pelo sucesso na vida, a angelical Linda, em um período de quatro anos seguidos de implacável suplício, interpretou uma adolescente fugitiva, enviada indevidamente a um reformatório e agredida sexualmente (Inocência Ultrajada, 1974); uma adolescente gravemente doente, presa em um avião em risco de colisão (Aeroporto 75, 1975); uma garota simplória seqüestrada por um homem mentalmente doente (Doce Refém, 1975); uma das passageiras de um avião sequestrado (Vitória em Entebbe, 1976) e uma jovem atormentada por sua prima do mal (Verão do Medo, 1978). Tudo isso, além de estrelar O Exorcista II: O Herege (1977), que, por si só, é sofrimento suficiente para uma década inteira. E, é claro, o telefilme em questão: Drama de Uma Adolescente, que contribuiu muito para que Linda se tornasse o protótipo da adolescente problemática dos filmes feitos para a TV nos anos 1970. 


Drama de Uma Adolescente começa com uma paródia de comercial de cerveja, no qual jovens atraentes e felizes bebem e jogam latas de cerveja alegremente uns para os outros, como se fossem frisbees. O comercial é intercalado com uma narração sombria, divulgando, em tom documental, estatísticas sobre alcoolismo e estudantes do ensino médio. Segundo os dados, um em cada dez adolescentes se tornará alcoólatra — e isso inclui Sarah Travis (Linda Blair), uma adolescente inteligente, tímida e solitária. Ela tem apenas 15 anos, mas lida com muitos problemas típicos de sua idade. Tenta entender o divórcio dos pais, o fato de não passar muito tempo com o pai Jerry (Larry Hagman) e de sua mãe Jean (Verna Bloom) já ter encontrado um novo marido.



Enquanto a menina, sentindo-se isolada e incompleta, anseia por amor e atenção de seus pais divorciados, sua mãe está mais interessada em manter a aparência de dona de casa rica, enquanto o pai prefere ser o “paizão divertido”, aparecendo apenas quando é conveniente para ele e dando a Sarah dinheiro para compensar sua ausência. Entediada e aborrecida, Sarah começa a bebericar restos em copos de festas, inocentemente, para se acalmar. E aí começa o drama.

Embora não tenha sido o pioneiro no gênero, Drama de Uma Adolescente foi um dos primeiros telefilmes a mostrar que a mistura de pais negligentes e publicidade irresponsável pode resultar em abuso de álcool (e outras substâncias) entre os adolescentes. 


Quando John Korty dirigiu Pergunte a Alice (Go Ask Alice, 1973) para o canal de televisão ABC, acabou dando início a um filão que durou até o final daquela década. Adaptado do livro homônimo, publicado em 1971 pela Prentice Hall, Pergunte a Alice é o relato de uma adolescente de 15 anos (espécie de precursora de Christiane F.) que desenvolve um vício em drogas e foge de casa, em uma jornada autodestrutiva. Atribuído a autor "Anônimo", o livro foi escrito em formato de diário e originalmente apresentado como o "diário real" da tal protagonista adolescente sem nome. Controvérsias à parte, no Brasil foi publicado pela editora Record, com o título Pergunte a Alice - Diário Íntimo de uma Jovem Drogada. E assim deu-se a largada na corrida dos telefilmes que tentavam mostrar essa realidade e alertar os telespectadores.


Voltando ao Drama de Uma Adolescente, o filme é bem dirigido, bem realizado, tem ótimo elenco e é acima da média padrão dos telefilmes da época. E Linda Blair, com todos os tiques de adolescente, está convincente no papel-título. Um gole ocasional aqui, outro ali e, rapidamente, Sarah está escondendo garrafas inteiras no armário do quarto (e bebendo vodka pura). É assim que ela encontra alívio para dor causada pelas promessas quebradas do pai, pelas garotas esnobes de sua nova escola e por sua mãe autoritária, que tenta empurrá-la para um encontro com o "melhor partido" da vizinhança, Ken (Mark Hamill). Mas o moçoilo, apesar de amistoso, dispensa Sarah educadamente. Como acontece com a maioria das pessoas, a bebida deixa a garota mais relaxada, mais sociável e não demora muito para que ela perca o controle e se veja dependente do álcool.



Uma das críticas, publicada em um jornal americano da época, ressaltou:

Sem revelar muito sobre a história, há alguns motivos vitais para se assistir "Sarah T.". Como quando a mãe percebe que a filha está bebendo e o padrasto a consola: "Pelo menos ela não está usando drogas!", e a mãe suspira, concordando: "Graças a Deus!"

William Daniels e Verna Bloom

Apesar do papel pequeno, porém significativo, Larry Hagman — que três anos depois se tornaria um dos vilões mais populares da TV, o J.R., de Dallas — está ótimo como o pai da protagonista mirim. Mark Hamill, dois anos antes de se tornar mundialmente famoso como Luke Skywalker, de Guerra nas Estrelas (Star Wars, 1977), também se sai bem como o amor não correspondido de Sarah.

Larry Hagman

Mark Hamill

A narrativa é uma torrente de experiências do irrefreável comportamento adolescente, com doses de negação e melodrama, o que espanta os possíveis momentos de tédio da história. Drama de Uma Adolescente é um ótimo exemplo de como os filmes para TV podiam ser tão bons (ou até melhores) que muitos filmes de cinema — dadas as devidas limitações de produção, claro — principalmente quando contavam com uma protagonista tão convincente quanto Linda Blair.



O diretor é ninguém menos que Richard Donner, dos sucessos A Profecia (The Omen, 1976), Superman - O Filme (Superman, 1978), Os Goonies (The Goonies, 1985), Feitiço de Áquila (Ladyhawke, 1985) e da franquia Máquina Mortífera (Lethal Weapon, 1987), entre outros. Depois de mais de uma década e meia dirigindo filmes para a tevê, Donner tornou-se um prolífico diretor de sucessos de bilheteria do cinema e construiu uma carreira admirável.


Com toda a repercussão subsequente, o telefilme ganhou uma edição em livro, escrita por Robin S. Wagner e traduzida mundo afora. No Brasil, saiu pela editora Record. Nas décadas seguintes, também chegou a ser lançado em VHS nos Estados Unidos e em alguns países da Europa.

Edição americana em livro

Edições portuguesa (à esquerda) e brasileira (à direita) em livro

O filme estreou na TV americana em 11 de fevereiro de 1975, pelo canal NBC (National Broadcasting Company). No Brasil, apareceu em 28 de setembro de 1976, na TV Rio - Canal 13, ganhando várias reprises nas décadas seguintes. Eu o descobri em 1993, quando foi exibido no Cinema em Casa, do SBT.

Folha de S. Paulo, 28 de setembro de 1976


Folha de S. Paulo, 8 de março de 1977


O Globo, 28 de setembro de 1993

Em 2019, o telefilme ganhou uma merecida edição em Blu-Ray (nos Estados Unidos).


Aqui no Brasil, recebeu um título alternativo menos conhecido: A Garota Viciada.

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