17 novembro 2023

O Sistema (The Glass House, 1972)

 Telefilmesquecidos #65

O professor universitário Jonathon Paige (Alan Alda) mata acidentalmente um homem durante uma discussão e acaba condenado por homicídio culposo. Ele e o jovem traficante de maconha Allan Campbell (Kristoffer Tabori) entram na prisão no mesmo dia em que o veterano idealista Brian Courtland (Clu Gulager) inicia seu novo cargo como guarda penitenciário. 

Os três personagens atuam como catalisadores dos acontecimentos que se seguem dentro do presídio. Os dois novos presos logo descobrem que a prisão é administrada por gangues prisionais, enquanto o novo guarda constata a corrupção dos guardas e do diretor.


Alan Alda

Kristoffer Tabori

Paige fica encarregado de trabalhar na farmácia. Hugo Slocum (Vic Morrow), o preso durão que ninguém ousa enfrentar, pressiona Paige a vender drogas para sua gangue. Paige se recusa a colaborar e ganha o respeito de Lennox (Billy Dee Williams), um prisioneiro negro e politizado que planeja reformar o sistema na marra.

Clu Gulager


Vic Morrow)

À medida que a história se desenvolve, fica claro que a prisão — assim como o mundo lá fora — funciona segundo um "sistema". Há acomodação, honestidade, cinismo, violência, cumplicidade, proteção, perseguição e todos os fatores que compõem a sociedade.

Para um telefilme de questão social do início dos anos 1970, O Sistema tem uma reputação impressionante: baseia-se em argumento coescrito pelo romancista Truman Capote, com roteiro de Tracy Keenan Wynn que combina habilmente várias personalidades fortes.

Billy Dee Williams


O Sistema também pertence ao seleto grupo dos telefilmes que foram “promovidos” às telas do cinema. Foi exibido nos cinemas brasileiros em 1974.

O filme se vale das ótimas atuações e da atmosfera. Aliás, o fato de ter sido filmado em uma prisão de verdade, com prisioneiros entre os figurantes, conferiu ainda mais realismo.  

O elenco está excelente. Alan Alda e seu personagem inicialmente indecifrável, perdido nos próprios pensamentos; Vic Morrow vivendo um assassino brutal e arrogante; Kristoffer Tabori como o rapaz ingênuo e despreparado para a vida na prisão; Billy Dee Williams em papel complexo, parte pacifista, parte revolucionário; e Clu Gulager, interpretando o novo guarda que parece ter alguma moral e que pode ou não se manifestar contra a corrupção no sistema prisional.



Dirigido de forma contida por Tom Gries, O Sistema se distancia muito da fórmula típica dos filmes feitos para a TV da época. Gries ficou conhecido por trabalhos como ...E o Bravo Ficou Só (Will Penny, 1967), A Mulher que Desejei (Fools, 1970) e O Assassinato de Sharon Tate (Helter Skelter, 1976). Também dirigiu inúmeros seriados desde os primórdios da TV, na década de 1950, até os anos 1970. Ratos do Deserto (The Rat Patrol, 1966-68) foi um deles.

Gries ganhou o Primetime Emmy Award de Melhor Direção de Série, Filme ou Especial Dramático em 1972 por este telefilme. O Sistema também ganhou o Golden Shell no Festival Internacional de Cinema de San Sebastián de 1972 e foi indicado ao Globo de Ouro de Melhor Filme para Televisão.

As questões com as quais o filme lida podem parecer clichês hoje, por causa dos inúmeros outros filmes e séries de prisão que surgiram desde então. Mas O Sistema tem o mérito de ser o pioneiro. E mesmo se tratando de um telefilme, a versão sem cortes de O Sistema traz o começo de uma cena de estupro coletivo.

A estreia na TV americana foi em 4 de fevereiro de 1972, na CBS. Na TV brasileira, foi exibido pela primeira vez em 4 de junho de 1980, na Bandeirantes. (Mas já havia sido exibido em nossos cinemas em 1974).

Jairo Ferreira, na coluna Filmes na TV, destacou: "O Sistema (canal 13) domina o horário das 21 horas, penetrando no sombrio universo dos presidiários." (Folha de S. Paulo, 4 de junho de 1980). A sinopse elogiava: "Excelente drama sobre a vida nos presídios, visto como ‘casa de vidro’ no filme, segundo o título original."

Numa das ocasiões em que foi reprisado, a sinopse do jornal explicava: "Pela violência da exposição, algumas cenas foram sujeitas a cortes de censura." (O Globo, 17 de abril de 1982).

Quando O Sistema foi para a Globo, exibido no Domingo maior, em 1987

Hugo Gomes, por sua vez, disse na coluna Os Filmes de Hoje (Jornal do Brasil, 17 de abril de 1982): "The Glass House revela as mazelas de uma grande penitenciária e sua contundência agride ainda mais por ser um quadro comum às prisões de todo o mundo." 

Na década de 1980, foi lançado em VHS em vários países, inclusive aqui no Brasil. Também na mesma década, O Sistema foi bastante reprisado, passando depois para a Globo. Faz tempo que sumiu da TV e permanece pouco lembrado hoje em dia. Mas continua absurdamente atual.

VHS brasileiro

VHS americano

Nos EUA, foi lançado em DVD em 2000 e em Blu-ray em 2018.


08 novembro 2023

O Exorcista do Demônio (The Demon Murder Case, 1983)

Telefilmesquecidos #64

O filme começa com o jovem Kenny Miller (Kevin Bacon) algemado e sendo levado de ônibus da prisão até o tribunal. Ele é acusado de homicídio e alega possessão demoníaca. Lá estão seu advogado Anthony Marino (Richard Masur), Joan Greenway (Cloris Leachman), uma repórter ateia que se envolveu na cobertura do julgamento, e o casal de demonologistas Guy e Charlotte Harris (Andy Griffith e Beverlee McKinsey), além de alguns padres.


Um flashback reconstitui a história de Kenny e ficamos sabendo como tudo teve início. O menino Brian (Charlie Fields), irmão da namorada de Kenny, Nancy (Liane Langland), passa a agir como louco de uma hora para outra. Ao que parece, o menino está possuído pelo demônio. 



Mesmo descrentes, seus pais acabam fazendo contato com o padre Dietrich (Eddie Albert) e com um casal de demonologistas, na tentativa de expulsar o demônio do corpo de seu filho. Como nada dá resultado, Kenny, para salvar a pele do garoto, desafia o demônio a possuir seu corpo e a deixar o pequeno Brian em paz.



É nessas condições que, algum tempo depois, cego de ciúmes, Kenny, supostamente possuído pelo diabo, esfaqueia um conhecido de sua namorada e comete o assassinato. 

O filme se baseia em um caso real, o julgamento de Arne Cheyenne Johnson, também conhecido como o caso "O Diabo me fez fazer". Em 24 de novembro de 1981, em Brookfield, Connecticut, Arne Cheyenne Johnson foi condenado por homicídio culposo pelo assassinato de Alan Bono, chefe de sua namorada e proprietário do imóvel que o rapaz alugava.




Foi o primeiro processo judicial conhecido nos Estados Unidos em que a defesa buscou provar a inocência com base numa alegação de possessão demoníaca por parte do réu. O caso atraiu interesse em todo o país, o que não só mobilizou a mídia como também gerou este telefilme.

Aliás, O Exorcista do Demônio cobre os mesmos eventos do terceiro filme da franquia de terror Invocação do Mal (The Conjuring, 2013), embora de forma totalmente diferente e com os nomes verdadeiros mudados.

Mas os personagens Guy e Charlotte Harris neste telefilme representam Ed e Lorraine Warren, considerados os maiores demonologistas do mundo. O casal ganhou notoriedade ao investigar diversos episódios sobrenaturais. 




Os Warrens participaram de inúmeros casos envolvendo fenômenos paranormais e possessões demoníacas. Tanto que viraram referência também na cultura pop, inspirando diretamente livros e filmes como os da casa de Amityville e, na última década, os da boneca Annabelle.


A direção de William Hale, apesar de meio simplória, não é ruim. Experiente, dirigiu vários telefilmes e séries populares da TV americana entre as décadas de 1960 e 1980.


Embora às vezes um pouco lento e com produção pra lá de modesta, o telefilme não deixa de ser interessante e curioso principalmente para os fãs da franquia Invocação do Mal, do casal Warren e, claro, de histórias paranormais. 


No auge do caso na mídia, entre 1981 e 1983, havia um plano de se produzir um grande filme contando toda a história. Mas o projeto nunca se realizou, devido a divergências envolvendo o casal Warren e a família cujo filho havia sido supostamente possuído pelo demônio.


Mesmo assim, em novembro de 1983 o escritor Gerald Brittle, com a ajuda de Lorraine Warren, publicou o livro The Devil in Connecticut (que depois causou o maior quiproquó). 


As atuações em O Exorcista do Demônio, de modo geral, são muito boas. O elenco de respeito e bastante popular na TV americana não é muito lembrado no Brasil, exceto por Kevin Bacon, na época ainda desconhecido. Ele havia feito Sexta-feira 13 (Friday the 13th, 1980) dois anos antes e ainda não tinha estourado com Footloose - Ritmo Louco (Footloose, 1984), lançado nos cinemas um ano depois deste telefilme.


O Exorcista do Demônio estreou na TV americana em 6 de março de 1983, na NBC. No Brasil, foi exibido pela primeira vez em 17 de maio de 1985, na TVS (que não muito tempo depois se tornaria SBT). Foi bastante reprisado pelo canal de Silvio Santos nas madrugadas da década de 1980.


Apesar de dublada, a versão da TVS/SBT continha legendas fixas na tela. Na época, a emissora exibia, de madrugada, alguns filmes simultaneamente dublados e legendados. Detalhe: na abertura, o título do filme em português foi sobreposto ao título original em inglês


Lançado em VHS no Brasil com o título O Caso do Demônio Assassino.


Os eventos reais nos quais o telefilme se baseia serviram de inspiração para o longa-metragem Invocação do Mal 3: A Ordem do Demônio (The Conjuring: The Devil Made Me Do It, 2021), dirigido por Michael Chaves.