30 janeiro 2014

Síndrome de pós-Avenida Brasil


Li uma entrevista muito boa com Manoel Carlos, nas páginas amarelas da Veja desta semana (29/01/2014). Apesar de ser um admirador do trabalho do autor, não é exatamente sobre ele que vou escrever. Minha motivação foi uma das respostas que ele deu: 
"No momento, todo mundo quer aquele ritmo instantâneo de Avenida Brasil. Mas quem fez aquilo foi o João Emanuel Carneiro, um autor jovem que buscava seu jeito de fazer novela. Isso não quer dizer que eu, aos 80 anos, deva sair por aí imitando um garoto. Não vou pagar o mico de macaqueá-lo. Vou fazer do jeito que sei. É no que acredito."


Avenida Brasil foi, indiscutivelmente, uma grande novela. Daquelas que pararam o país, como há tempos não acontecia. Deu até pra relevar alguns desacertos, que não chegaram a comprometer a trama. Mas desde seu fim, cresceu a mania do público - em especial no twitter - de comparar todas as novelas com Avenida Brasil, como se, depois dela, nenhuma mais prestasse.

Radicalismos à parte, nenhuma novela está livre de deslizes. Ainda mais hoje em dia, diante do escrutínio do público, sempre com a boca no trombone nas redes sociais. Qualquer errinho mínimo se agiganta, vira piada nacional. Os tuiteiros são implacáveis e rápidos demais nos julgamentos. 

É claro que algumas telenovelas realmente não são bem sucedidas. Vão mal de Ibope, a trama apresenta furos, irregularidades, os personagens não cativam o público... Mas isso não é regra. No entanto, no twitter, tenho a impressão de que as novelas ficam quase em segundo plano, já que o foco é comentá-las (leia-se criticá-las) freneticamente. Vira uma espécie de competição para ver quem vai apontar um erro primeiro, ou quem vai fazer a piada mais rapidamente.


É comum comentar as novelas em tempo real. É quando a maioria dos tuiteiros 'comentaristas' convergem para o mesmo programa. Novela ainda é uma paixão nacional, por mais que o gênero passe por altos e baixos. Seja para aplaudir ou atirar pedras, o Brasil está sempre de olho nela. Se por um lado o público (por meio do twitter) está muito próximo de quem faz a novela (emissoras, autores, artistas) e tem a chance de expressar sua euforia pelas tramas, por outro parece que muita gente está mais preocupada em fazer comparações ou achar falhas e defeitos nas novelas.

Em Família, de Manoel Carlos, nova trama das 21h que estreia semana que vem, nem começou e já estão pipocando "críticas" no twitter. Sem terem visto ao menos um capítulo! Reclamam que vai ser mais do mesmo, que será lenta, arrastada, com os mesmos assuntos etc. Mas novela é isso: são sempre os mesmos assuntos. E cada autor tem seu estilo e sua marca. Se não gosta de determinado autor, é simples: não assista. Ou então faça críticas inteligentes e bem-humoradas. Mas ficar sempre resmungando a mesma coisa torna-se cansativo até mesmo no twitter.


Apesar de gostar muito do estilo de Manoel Carlos, suas duas últimas novelas não me empolgaram muito. Mas acho difícil julgar Em Família apenas por algumas chamadas e propagandas. Os tuiteiros parecem não querer aceitar o fato de que a nova novela NÃO será uma Avenida Brasil e nem tem obrigação de ser. Não é essa a proposta. É chata essa 'má vontade' que se instalou no público depois do fim de Avenida Brasil. E fico com a impressão de que, para os tuiteiros, nenhuma novela vai prestar depois de Avenida Brasil. O que é uma pena, pois acabam perdendo o prazer de curtir uma nova trama que, se não for sensacional, poderá ser ao menos potencialmente boa.

3 comentários:

  1. Concordo com o que disse Daniel, e infelizmente existe grande parcela de internautas que não sabe apreciar a obra como um todo. "Avenida Brasil" em minha opinião foi um fenômeno de muito mais por sua abordagem popularesca no texto, sobretudo nos diálogos do que em sua estrutura. Aquilo ali era uma telenovela como qualquer outra. João Emanuel Carneiro não reinventou a roda, inclusive o próprio fez em "A Favorita" ganchos muito mais ágeis, que deixavam a novela com cara de seriado, do tipo que você perde um capítulo e já não entende bem o capítulo seguinte.
    Não gostei de "Páginas da Vida" nem "Viver a Vida" - porque em ambas deu pra perceber o cansaço do Maneco na escrita dos capítulos. A impressão era que depois dos 30 capítulos de frente, a história começava a perder força, e passava a girar sem rumo. Espero que a despedida do autor seja ótima pois dentre alguns defeitos, os diálogos escritos por ele são simplesmente os mais críveis.

    ResponderExcluir
  2. ainda que muitos procurem em uma novela uma lobotomia para chamar de sua, acredito que há uma carência enorme do expectador por ser tratado como um ser pensante -- ainda que recheado de muitos clichês... mas o que é a vida que não uma piscina cheia de clichês e algumas gotas de água?

    Avenida Brasil é um caso clássico em que o a soma das partes (enredo, elenco, Carminha ♥, direção, apelo popular, escracho) é maior que o todo!

    junto a todas essas características, há a memória afetiva de quem a acompanhou -- tal namoro que acabou quando um ainda estava a fim, e que acaba se lembrando só das partes boas...

    JEC criou monstrinhos, ávidos por uma vilã (meninos, perdão, mulheres são melhores sendo péssimas!) melhor que a Carminha, por uma história mais instigante, por uma mocinha que conheça pendrive...

    tomara que, na próxima, ele mantenha o nível (especialmente para instigar os demais autores a se reinventarem)!

    :***

    ResponderExcluir
  3. Sinceramente, eu acho que Avenida Brasil não foi esse sucessão todo que muita gente fala. Parece que foi mais uma forçação de barra da Globo pra fazer marketing da novela. Aliás, dizem que Avenida Brasil teve apenas 51 pontos de audiência no seu último capítulo.

    ResponderExcluir