Telefilmesquecidos #39
Jimmy Wheeler (Stacy Keach) é um fotojornalista viajando de carro, tranquilamente. Na estrada do Kentucky, ele passa por um garotinho que vinha andando na beira da pista. Vendo o esforço do garoto, que carrega mantimentos com certa dificuldade, Jimmy oferece uma carona ao simpático menino (Tim Parkinson), que se apresenta como Gilbert. O rancho onde o menino mora revela-se mais fora de mão do que Jimmy poderia pensar. À medida que a estrada avança mais e mais na floresta, começa uma chuva que vai só aumentando.
Ao chegar ao local, Jimmy vê que a família do garotinho é composta apenas por seus seis irmãos e irmãs, que vivem no mais completo isolamento, dominados pelo mais velho, Peter (John Savage). Na verdade, os pais das crianças morreram há algum tempo e Peter, assumindo o comando, inventou um esquema de sequestro de adultos para desempenhar os papéis de mãe e pai (óbvio que isso não é dito, mas Jimmy, aos poucos, deduz). A criada, Carol Ann (Samantha Eggar), a quem os garotos chamam de "mãe", na verdade está ali contra sua vontade. Há um clima tenso no ar.
Tim Parkinson e Stacy Keach |
As crianças logo cercam Jimmy e passam a tê-lo como uma figura paterna. Mas logo ele descobre que, antes dele, outros incautos haviam caído na arapuca. E aqueles que não eram adequados para os "papéis" sumiam misteriosamente, da noite para o dia. Para completar, uma fiel matilha de cães ferozes garantia que nenhum dos supostos pais fugiriam do rancho.
O diretor Burt Kennedy faz um bom trabalho em gerar muito suspense e um clima sinistro logo no início, auxiliado por excelentes atuações de Stacy Keach canalizando a raiva, John Savage transparecendo perturbação convincente e Samantha Eggar personificando o terror. Robby Benson, ainda antes de se tornar um dos ídolos adolescentes dos anos 1970, interpreta um dos irmãos que, apesar da pouca idade, já dá sinais de um masoquismo perverso. (Benson também canta a piegas música-tema do filme, All The Kind Strangers).
Robby Benson |
Samantha Eggar |
Se há uma palavra para descrever Todos Muito Estranhos, esta palavra é perturbador. Com um certo clima meio Colheita Maldita (Children of the Corn, 1984), Aldeia dos Amaldiçoados (Village of the Damned, 1960), e Todas as Noites às Nove (Our Mother's House, 1967), este telefilme consegue ser bastante assustador quando você descobre o que realmente está acontecendo. Mais uma vez, fica patente como lindas crianças podem ser mais assustadoras do que monstros propriamente ditos. Some-se a isso a fotografia vibrante da locação, um baita contraste com o clima sombrio da história. (Há alguns anos fiz um post sobre filmes de suspense/terror com crianças. Todos Muito Estranhos se encaixaria bem à lista).
John Savage |
Como se trata de um filme feito para a TV, alguns subtextos, digamos, mais excêntricos do enredo não foram explorados. Se a história tivesse ganhado um pouco mais de espaço para respirar, em termos de duração e conteúdo mais ousado, Todos Muito Estranhos poderia ter sido um interessante filme de cinema. É contido, mas são justamente as coisas não vistas que tornam este filme assustador. Mesmo assim, termina de forma meio abrupta (74 minutos), deixando no telespectador uma curiosidade de ver como a história prosseguiria daquele ponto.
Todos Muito Estranhos foi ao ar nos EUA pela primeira vez em 12 de novembro de 1974, pela ABC. No Brasil, demorou um pouco para ser exibido: só estreou na Globo em 8 de abril de 1981, na sessão Première 81. Fernando Morgado, na coluna de filmes da TV, da Folha de S. Paulo, comentou sobre o telefilme: "O tema promete, mas há uma preocupação: até hoje, a Première 81 da Globo não exibiu um só filme de qualidade." (Na Première 81 a Globo exibia, às quartas-feiras, no horário nobre, filmes de longa-metragem, inéditos na TV brasileira).
O telefilme foi reprisado algumas vezes nas madrugadas da primeira metade dos anos 1980. Nas reprises posteriores, as colunas de filmes da TV comentaram: "Estranha história a partir deste drama de suspense feito para a televisão" (Folha, 26 de setembro de 1981). O Globo (1985) publicou: "Thriller feito para a TV, reciclando o tema de Todas as noites às nove", com Eggar em papel similar ao de O Colecionador".
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