28 novembro 2016

E seu nome é Jonas


A Rede Globo tinha acabado de exibir o capítulo da novela Água Viva naquela noite de sábado, 31 de maio de 1980. Foi quando o telefilme E Seu Nome é Jonas (And Your Name Is Jonah) estreou na tevê brasileira, às 21h30. Havia feito sua estreia na tevê americana há pouco mais de um ano (28 de janeiro de 1979). Na época, não era comum que um filme chegasse à nossa tevê tão rápido. E, não menos rápido, ele se tornou um clássico dos telefilmes, tendo sido bastante reprisado ao longo daquela década.


Era a história de Jonas, um menino de 9 anos, internado, ainda pequeno, em uma instituição para crianças com deficiência mental. Mas tudo não passara de um grande erro de diagnóstico, já que o garoto era apenas surdo e não retardado. Chocados e consternados, os pais precisam reparar o erro da forma que puderem. O filme mostra a luta do casal (interpretado por Sally Struthers e James Woods) para tentar recuperar a audição do menino, ensiná-lo a falar e integrá-lo à sociedade. As barreiras logo surgem, aumentando as dificuldades, tanto dentro quanto fora de casa.

Jeff Bravin, Sally Struthers e James Woods



O curioso é que Jeffrey Bravin, o garoto que interpretou Jonas, é surdo na vida real. Jeff foi escolhido para o papel após várias entrevistas com outros garotos surdos dos Estados Unidos. O filme tornou-se emblemático por mostrar a delicada situação de forma realista, com todas as suas dificuldades, sem soluções mágicas ou final milagroso. Bravin se comunicava com o elenco e a equipe por meio da língua de sinais e de leitura labial. No final das filmagens, ele e Jeremy Licht, de 7 anos (que interpretava seu irmão Anthony), já haviam se tornado amigos. A revista Life de 1º de fevereiro de 1979 confirmava que Jeff era perfeito para o papel:

Inicialmente os produtores estavam preocupados com a escalação de uma criança surda e ainda ator novato para o papel-título. Mas quando viram Jeff em ação, ficaram impressionados e maravilhados. Ele entendia intuitivamente como usar os gestos e movimentos para interpretar Jonas, uma criança retraída, o contrário do que ele é de verdade. Ao final das filmagens, o entusiasmado Jeff já tinha ensinado ao elenco e à equipe como se comunicar por meio dos sinais. Ficaram emocionados com a habilidade especial de Jeff, de "ouvir" sem o auxílio da audição e de "conversar" sem a fala. De sua parte, Jeff disse que curtiu a experiência de atuar, mas, no geral, prefere se tornar um jogador de basebal.

Jeff e Bernard Bragg ensaiando uma cena

Jeff ensinando à Sally Struthers alguns sinais
O filme, dirigido por Richard Michaels, foi inovador. Pela primeira vez, vários personagens foram interpretados por atores surdos de verdade, o que garantiu ainda mais o realismo da narrativa (que tinha tudo para cair no melodrama banal, mas resultou em um filme tocante). A relação de amizade de Jonas com o avô é explorada de forma comovente. O sofrimento da mãe, amorosa, mas angustiada por sentimentos de culpa, também. A dificuldade do pai em lidar com a situação dificulta ainda mais as coisas. Ele não consegue ficar perto e nem se afastar totalmente. As divergências entre linhas de tratamento opostas também dividem os pais de Jonas: ensinar a língua de sinais ao filho ou forçá-lo a tentar falar?

Após a exibição do filme, a revista People de 5 de fevereiro de 1979 destacou o talento do jovem ator:

(...) Quando o nova-iorquino Jeffrey Bravin, 9, fez sua bem aclamada estreia no fim de semana passado, no filme da CBS E Seu Nome é Jonas, sobre o isolamento de um garoto surdo, o elenco, incluindo Sally Struthers, virou seu maior fã. "Caí de amores por ele", disse Sally, que viveu sua mãe no filme e ainda se corresponde com ele, meses depois. O diretor Richard Michaels acrescenta: "Com Jeff descobri a diferença entre ouvir e escutar". Michaels se refere não apenas ao roteiro, mas à própria vida do garoto: Jeff faz parte da quarta geração da família Bravin a nascer com a surdez.
Excelente aluno e atleta, Jeff curtiu a experiência de ser astro de TV, apesar de compreender a dificuldade que seria seguir uma carreira de ator. Mas ele não será esquecido. O diretor Michaels diz: "Essa foi a experiência mais extraordinária em comunicação que já vivenciei".

Membro atuante e engajado na comunidade surda, Jeff Bravin tornou-se, em 2014, diretor executivo da American School for the Deaf (ASD), a mais antiga escola integral para surdos dos Estados Unidos. "Em suma: Servirei de modelo para as crianças surdas aqui", disse ele, ao assumir o cargo. "E vai ser um sinal muito claro de que uma pessoa surda pode exercer esse tipo de função. Isso provavelmente não teria sido possível alguns anos atrás." Fundada em 1817, em Hartford, Connecticut, a ASD atende alunos surdos de todas as idades.

Jeff Bravin atualmente

Mesmo tendo sido produzido há quase quatro décadas, as barreiras apresentadas no filme ainda são atuais. A parte tecnológica do tratamento pode ter evoluído, mas os medos, inseguranças e preconceitos por falta de conhecimento continuam presentes. É comum que telefilmes abordando doenças ou limitações físicas tornem-se datados (e até caricatos) após certo tempo. Não é o caso de E Seu Nome é Jonas. Talvez, por isso, a história relatada no filme continue tocante. 


Jeff no filme, em 1979, e atualmente

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Para quem se interessa por telefilmes de temática parecida com a de E Seu Nome é Jonas, no começo do ano fiz um post sobre O Amor é Mais Forte.

3 comentários:

  1. A forma correta é LÍNGUA DE SINAIS e é SOMENTE SURDO e não surdo mudo! favor corrigir seu texto, que mesmo com estes pequenos contratempos é bem legal para tirar a curiosidade.

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    1. Muito obrigado pelo toque, Patrícia! As correções foram feitas.

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  2. Informações excelentes sobre esta grande obra. Parabéns!

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