06 outubro 2014

Leitura partilhada por várias gerações


Outubro, "mês das crianças". E o comércio, cada vez mais, estimula a compra de presentes (especialmente brinquedos) para os pequenos. Nada contra. Eu também fui criança e adorava ganhar presentes. Semana passada mesmo recebi um e-mail de uma editora de livros, divulgando uma promoção: "Nesse Dia das Crianças, presenteie com livros". Achei bacana. Afinal, se é para presentear as crianças, por que não com livros? Lembrei de como eu adorava ganhar livros na minha infância.

Por mais que pareça improvável, crianças gostam de livros sim. É comum ouvir as pessoas mais velhas dizendo que os jovens de hoje não leem mais. Mas de uns tempos pra cá, a coisa parece ter mudado. Na última década, os livros de ficção infantojuvenil viraram febre entre crianças e adolescentes. Até adultos entraram na onda de vampiros, feiticeiros ou guerreiros, em sagas que renderam um sem-número de continuações e similares.

Quando eu era criança, os livros da coleção Biblioteca Infantil da Livraria Quaresma ajudaram a  despertar em mim o prazer da leitura. Tinham pertencido à minha mãe e ao meu tio. Meu avô havia comprado e dado de presente pra eles, na década de 1950. Nos anos 80, descobri a coleção - já muito datada e obsoleta - na estante da casa da minha avó. Dali em diante, passei uns bons anos com aqueles personagens povoando meu imaginário. Eu havia aprendido a ler há pouco tempo e comecei a me fascinar por aquele universo empoeirado e, aparentemente, esquecido.

Três livros da coleção que "herdei": guardo até hoje.

Assinei meu nome nos livros, com aquele orgulho de criança
que acabou de aprender a escrever o próprio nome

Em sua tese Brasil em imaginação: livros, impressos e leituras infantis (1890-1915), Andréa Borges Leão, Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo, explica o começo dessa coleção:

A partir dos anos de 1890, Pedro da Silva Quaresma, comerciante de livros populares do Rio de Janeiro, iniciou um movimento de nacionalização do livro de literatura infantil. Diante do que argumentava ser a desigualdade entre o universo linguístico dos textos traduzidos do francês para o português de Portugal e o das crianças brasileiras, Quaresma encomendou ao romancista Alberto de Figueiredo Pimentel a compilação dos contos que andavam dispersos na tradição oral brasileira, não em um só livro, mas em toda uma coleção escrita na linguagem cotidiana. (...) 
No dia 14 de abril de 1894, foi publicado o primeiro volume da Biblioteca Infantil da Livraria Quaresma: o livro Histórias da Carochinha. Logo após, surgiram Histórias da Avozinha (1896), Histórias da Baratinha (1896), Histórias do Arco da Velha, Histórias de Fada, Contos do Tio Alberto, Os Meus Brinquedos, Teatrinho Infantil, O Álbum das Crianças, Castigo de um Anjo e O Livro das Crianças. 
(...) 
Os Contos da Carochinha, as Histórias da Avozinha e as Histórias da Baratinha alcançaram grande êxito entre a criançada, e sucessivas tiragens para Pedro da Silva Quaresma.

Vários daqueles contos eram releituras de fábulas já conhecidas. Outros, nem tanto. Eram histórias curtas, recheadas de fantasia, sentimentalismo excessivo e até mesmo toques sombrios. A maioria com uma moral no final. Coisas engraçadas também tinham vez, mas quase sempre pendendo para um humor negro.


A página de abertura dos livros já anunciava: "Esplêndida coleção dos mais célebres contos populares, morais e proveitosos de vários países, alguns traduzidos dos Irmãos Grimm, Perrault, Andersen, Madame d'Aulnoy etc., e outros recolhidos diretamente da tradição oral."

As pequenas ilustrações - muito modestas, se comparadas às gravuras das publicações de hoje - eram de Julião Machado, célebre ilustrador português do final do século XIX. Junto com as histórias, os desenhos também me atraíam, porque davam apenas uma pequena pista do que seria lido. Eram suficientes para despertar a curiosidade, mas não a ponto de saciar a imaginação. E isso era ainda mais instigante.

"O Filho Ingrato", "Berta, a Esperta", "As Três Fiandeiras", "As Moedas Caindo do Céu", "O Chouriço", "A Centenária", "A Forca" e "O Papagaio Real" foram algumas das histórias que li e reli durante muito tempo, espalhados nos volumes da coleção.






Toda leitura é enriquecedora. Minha intenção não é dizer quais livros as crianças e os jovens devem ler. Mesmo quando se questiona a "qualidade literária" das obras, o importante é cativar leitores novos que, no futuro, poderão apreciar também outras formas de literatura. E feliz Dia das Crianças que leem!

12 comentários:

  1. Olá, Daniel
    Reparo que você tem livros do autor Figueiredo Pimentel. Faço uma pesquisa acadêmica sobre livros infantis do século XIX e uma das informações necessárias para mim é acerca da história "Castigo de um anjo", do mesmo autor. Você tem conhecimento sobre ela ou alguma informação útil que possa ajudar?

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    1. "O Castigo de um Anjo" está no volume 8 da Biblioteca Infantil da Livraria Quaresma. Esse volume se chama "Histórias do País de Ali-Babá". Pelo que entendi da história, ela é de origem russa.

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  2. Infelizmente não tenho nenhuma informação sobre esse conto especificamente. Tenho alguns dos livros da coleção ainda, mas não sei detalhes da criação de cada conto. Não conseguiu achar nada na internet?

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  3. estou doida pra comprar este livro,fez parte de minha infancia

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  4. infelizmente não há muita informação sobre essa obra na internet. Foi um conto publicado separadamente, só isso que sei. Mas, agradeço pela resposta.

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  5. Olá, Daniel, boa noite. Sou estudante de pós-graduação e trabalho com uma pesquisa sobre Contos da Carochinha, livro extremamente raro. Você poderia me informar qual o número da sua edição, por gentileza?

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    1. Oi Natasha, tudo bem? A minha edição é a vigésima quarta (1956). Se precisar de mais informações, estou às ordens.

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    2. Muitíssimo obrigada peloa informação, Daniel Couri! Estou a procura de uma versão mais antiga, bem rara, alguma mais próxima a primeira. Caso você conheça alguém que tenha alguma edição mais antiga de Contos da Carochinha, você poderia, por gentileza, me contatar?

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    3. Tínhamos em casa está coleção, doei para biblioteca.

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  6. Hoje comecei um leitura compartilhada com o meu filho do livro Histórias do Arco da Velha,estamos amando o livro,realmente foram anos dourados,ele tem muitos livros mas até agora nenhum que trabalhe as virtudes dessa maneira,além do Nárnia.Uma pena os livros infantis terem perdido tanto a qualidade .

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  7. Estou lendo o livro Histórias do Arco da Velha com o meu filho de 8 anos, estamos gostando muito,ele tem alguns livros,mas até agora o único que também trabalhou as virtudes foi o Nárnia,realmente foram anos dourados é uma pena a literatura infantil ter mudado tanto.

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  8. Eu ganhei essa coleção toda no meu aniversário de 7 anos, em 26/10/69. Coloquei meu nome e a data em todos os volumes, exatamente como você fez. Ainda tenho os livros.

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