Telefilmesquecidos #98
Em 1968, Doris Winters (Tuesday Weld) é acusada do homicídio de seus dois filhos pequenos. A questão é que Doris, além de jovem e atraente, é divorciada e leva uma vida liberal (trabalha como modelo de lingerie), o que não era nada bem visto na época.
Louis Kazinsky (Ron Leibman), o detetive encarregado das investigações, quer colocá-la atrás das grades a qualquer custo, com ou sem provas condenatórias. Assim como grande parte da opinião pública, que repudia o estilo de vida independente de Doris — lembrando que, na década de 1960, uma mulher divorciada era muito malvista — o detetive também não aprova o modo de vida de Doris.
A imprensa explora ao máximo o sensacionalismo do caso e Doris torna-se vítima dos preconceitos dominantes, sendo condenada mesmo sem provas.
O telefilme é inspirado no caso real de Alice Crimmins, uma mãe solteira de Nova York que foi julgada e condenada pelo assassinato de seus dois filhos em 1965, apesar da falta de evidências que a conectassem ao crime. Crimmins foi condenada basicamente por causa de sua reputação e aparência.
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Alice estampando um dos jornais da época (Daily News, 14 de julho de 1968) |
Na vida real, os filhos de Alice Crimmins, Eddie Jr., de 5 anos, e Missy, de 4 anos, desapareceram de seu apartamento, no bairro do Queens, em Nova York. Ela relatou o sumiço das crianças à polícia. Naquele dia, mais tarde, Missy foi encontrada morta, estrangulada. Cinco dias depois, o corpo de Eddie foi descoberto, mas as autoridades não conseguiram identificar a causa de sua morte. Tampouco foram encontradas evidências que ligassem Alice (ou quem quer que fosse) às mortes.
Em um dos julgamentos mais divulgados da época, Alice foi condenada por homicídio culposo. No entanto, seis anos após a morte de seus dois filhos, ela foi julgada novamente. Desta vez, foi condenada por homicídio doloso em primeiro grau, pela morte do filho, e homicídio culposo pela morte da filha.
Mesmo antes de ir a julgamento, Alice já havia sido considerada culpada pela imprensa e pelo público. No entanto, havia quem acreditasse que ela estava sendo julgada, na verdade, por sua liberdade sexual e não pelos assassinatos.
Nunca houve qualquer prova que ligasse Alice aos crimes. Nenhum outro suspeito foi considerado. O trabalho investigativo foi precário, a polícia, preconceituosa, e as testemunhas, pouco confiáveis.
Depois de permanecer presa por quase uma década, Alice conseguiu liberdade condicional. Nunca ninguém conseguiu saber o que de fato aconteceu.
Com roteiro de Jack e Mary Willis, o foco deste telefilme acima da média — que não pretende estabelecer uma conclusão — está nos personagens e em como as opiniões podem ser facilmente influenciadas.
O ponto alto do elenco é Tuesday Weld, atriz brilhante que nunca chegou a ter o devido destaque, embora tenha recebido diversos prêmios por suas atuações. Não por acaso, John J. O'Connor, do New York Times (21 de fevereiro de 1978), escreveu: "Uma Questão de Culpa tem seus momentos interessantes, e a maioria deles deve-se a Tuesday Weld no papel de Doris."
Tuesday começou no cinema ainda nos anos 1950. Mais tarde, ficou conhecida por interpretar mulheres impulsivas, muitas vezes imprudentes. Foi indicada ao Globo de Ouro por O Destino que Deus me Deu (Play It as It Lays, 1972), ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por À Procura de Mr. Goodbar (Looking for Mr. Goodbar, 1977) e ao BAFTA por Era uma Vez na América (Once Upon a Time in America, 1984).
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Tuesday Weld |
Sem deixar o cinema de lado, atuou em diversos telefilmes como Reflexos de um Crime (Reflections of Murder, 1974), F. Scott Fitzgerald em Hollywood (F. Scott Fitzgerald in Hollywood, 1975) e O Inverno da Nossa Desesperança (The Winter of Our Discontent, 1983), pelo qual foi indicada ao Emmy, além de vários outros filmes para a TV. E não escondia sua preferência: "O que eu adoro na TV é o ritmo", disse ela, em entrevista a Tom Burke, para o jornal Chicago Tribune (30 de abril de 1978). "Duas semanas, mesmo para um papel pesado, é ótimo. Pensar demais em um papel é um desastre para mim. Quer dizer, vamos lá, vamos fazer."
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Ron Leibman |
Ron Leibman, que marcou presença na TV e nos cinema entre as décadas de 1960 e 2000, também cumpre sua função, apesar de seu papel unidimensional no filme. A veterana Viveca Lindfors, que até aquela época não costumava participar de telefilmes, faz uma participação.
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Viveca Lindfors |
O diretor, Robert Butler, dirigiu inúmeros seriados de sucesso (Jornada nas Estrelas, Missão Impossível, Gunsmoke, Kung Fu, Os Waltons, A Gata e o Rato etc.) entre as décadas de 1960 e 1990, além de uma penca de telefilmes como S.O.S. a 15.000 metros (Mayday at 40,000 Feet!, 1976) — exibido nos cinemas brasileiros em 1977 — e outros tantos.
No cinema, dirigiu Viva o Garotão Prodígio (The Computer Wore Tennis Shoes, 1969) e O Chimpanzé Manda-Chuva (The Barefoot Executive, 1971), comédias juvenis da Disney estreladas pelo então novato Kurt Russell, entre outros títulos.
Uma Questão de Culpa estreou na TV americana em 21 de fevereiro de 1978, na CBS. Só chegou à nossa TV dez anos depois, quando foi exibido pela primeira vez no Brasil pela Globo, em 21 de maio de 1988 na Globo, no Supercine.
Lançado em VHS no Brasil pela Herbert Richers.